Revista Ephemeris – Semente do Modernismo Brasileiro
Para
Teresinha Queiroz
Lucídio
Freitas, filho de Corina e Clodoaldo Freitas, nasceu em Teresina, a 5 de abril
de 1894. Fez os primeiros estudos no Liceu Piauiense, onde
concluiu os Preparatórios. Orientado pelo pai, desde cedo adquiriu sólida
cultura humanística. Compôs os primeiros poemas ainda na adolescência.
Em
1911, estudante na Faculdade de Direito do Recife, foi eleito conselheiro da
primeira diretoria do Centro Acadêmico do Recife, filiado à Federação dos
Estudantes Brasileiros que, por sua vez, era filiado à Liga dos Estudantes
Sul-Americanos. A eleição se processou numa das salas da Sociedade dos Artistas
Mecânicos e Liberais. Eis a diretoria, completa: presidente, José de Góes
Cavalcanti; vice, Bandeira de Mello; 1º secretário, Waldemar C. Leitão; 2º
secretário, Henrique Figueiredo, orador, Eurico Souza Leão; vice orador, Eládio
Ramos; tesoureiro, Pedro Allaian Teixeira; bibliotecário, Carlos Gonçalves.
Conselheiros: José de Barros Wanderley, Augusto Pessoa, Malta Filho, Souto
Maior, Lucídio Freitas, Agrício Mello, Samuel Chaves, Alexandre Lopes, Assis
Costa, Marques de Oliveira, Mattos Barbosa e Afonso Neves Batista. A posse se
deu a 24 do corrente, de acordo com nota publicada no jornal A Província (PE), edição de 11 de
setembro de 1911, primeira página.
Em 1912, aos 18 anos de idade, estreou
em livro com Alexandrinos, coletânea
de versos, em parceria com o irmão Alcides Freitas. O livro foi bem recebido
pela crítica literária, angariando elogios. Por aquele tempo, a casa do pai era
um dos pontos de encontro da intelectualidade piauiense.
“Neste mesmo ano, preocupado com a
preservação da memória cultural do Estado, distribuiu questionário aos
intelectuais, depois publicando, em jornais, as respostas, com o objetivo de
definir, na visão dos mesmos, quem era e quais foram os principais intelectuais
do Estado, bem como avaliar o movimento literário local e as expectativas para
o futuro”, relata Teresinha Queiroz, em Os
Literatos e a República. Teresina: FCMC, 1994).
Ainda em
1912, nas eleições para a substituição do governador Antonino Freire, por
insistência do pai, Lucídio Freitas engajou-se na campanha oficial e vitoriosa
de Miguel Rosa para o governo do Piauí (1912 – 1916). Em retribuição, foi
nomeado Lente de História do Brasil no Liceu Piauiense e Delegado Geral da
Capital.
O jornal O Apóstolo, órgão oficial da Diocese do
Piauí, edição de 12 de maio daquele ano, página 3, sob o título No Liceu, publicou: “Tudo acanalhado!
O
governador teve o cinismo de nomear lentes do Liceu criançolas, sem
composturas, como Lucídio Freitas e Christino Castelo Branco.
Os
briosos estudantes não engoliram a pílula.
Expulsaram
o primeiro debaixo de uma tremenda vaia.
Quando ao
segundo – o nanico Christiano, azucrinaram-lhe os ouvidos com uma bomba
inocente, fazendo molhar as calças e correr em busca do coronel Cazuza
Avellino, diretor da Instrução Pública, pedindo providência. O severo Cazuza
respondeu formalizado:
- Que
quer, meu senhor?! Os meninos são terríveis! Faça como seu Lucídio! Não venha mais aqui!
Eis a que
se reduziu a primeira casa da instrução pública! O governador acanalhou tudo.
Os estudantes é que não estão pelos autos e tangem os poldrinhos a cabo de
vassoura.
É mais
uma lição.”
O Apóstolo, que tinha como diretor chefe Elias Martins, era
órgão ligado à União Popular, que fazia oposição ao governador Miguel Rosa.
A 9 de abril de 1913 recebeu o grau de
Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro,
junto com Oscar Couto, Pergentino Pereira Guimarães, Antônio Antunes
Figueiredo, Francisco de Paula Santiago, Victor Mattos Rudge e Armando de
Aguiar Cardoso, conforme nota publica no jornal A Época do Rio de Janeiro, edição de 10 de abril de 1913, página 7.
Ainda estudante chegou a ser nomeado promotor público da comarca de Amarante,
não tendo assumido efetivamente o cargo.
A 18 de
novembro daquele ano (1913), por discordar radicalmente da política imposta pelo
governador Miguel Rosa, homem de gênio irascível, brigão, malcriado, rancoroso,
de poucos amigos e muitos inimigos, exonerou-se dos dois cargos e, acompanhado
pelo poeta Zito Batista, seguiu para o Rio de Janeiro, onde ficou mais de um
ano trabalhando na imprensa e fazendo literatura.
“É deste
período sua maior aproximação com as rodas literárias cariocas, pelas mãos de
Clóvis e Amélia Bevilácqua. Torna-se amigo de Mário Pederneiras, da revista Fon-Fon, e insinua-se nos grupos
literários mais famosos, frequentando assiduamente as casas de Coelho Neto,
grande animador dos valores novos, de Félix Pacheco, de Hermes Fontes e outros.
Circula pelas livrarias da moda e faz parte da boêmia literária carioca”, de
acordo com Teresinha Queiroz.
Vejamos
texto publicado na revista Fon-Fon,
Rio de Janeiro, edição de 8 de novembro de 1913, no 45, ano II, página 46: O Norte Intelectual – “(...) Foi sempre
doutrina literária de Fon-Fon não
cingir-se a preferência de escolas nem feitio de versos. Acolhe o que seja bom
e que tenha mérito.
Agora a
moderna Poesia do Norte vem trazer a Fon-Fon
o seu contingente de sangue novo da nova geração que ali floresce.
E é o
pequeno e esquecido Estado do Piauí que se apresenta, cavalheirescamente, na
elevada ação literária dos nossos dias. São os modernos poetas piauienses que Fon-Fon recebe de braços abertos e com
grande orgulho.
Lucídio
Freitas, Zito Batista, Abdias Neves trazem a Fon-Fon a documentação do seu valor de poeta, de bons poetas, em
produções que denunciam um excelente movimento literário nortista.
E seja
feita aqui uma referência especial a uma individualidade literária piauiense
desaparecida prematuramente do mundo.
É Alcides
Freitas que, com seu irmão Lucídio, publicou, o ano passado, um excelente
Plaquette, que recebeu o nome de Alexandrinos.
Alcides
de Freitas morreu, há meses, novo, pouco depois de se haver doutorado em
Medicina na Bahia.
Era um
poeta originalíssimo, de uma dolorosa originalidade triste, pela natural
expressão que, como médico, lhe produzia certeza do seu fim próximo.
Deixou um
magnífico livro de versos inéditos e outro de crônicas e impressões.
De todos
estes novos poetas, novos e bons, Fon-Fon
vai ter o prazer de publicar produções que justifiquem a afirmação com que
iniciou esta nota: o Norte Intelectual movimenta-se”.
Lucídio
Freitas ingressou na magistratura, sendo nomeado, a 14 de abril de 1915, Juiz
Substituto da Vara Criminal de Belém do Pará, conforme nota publicada no Jornal do Brasil, edição de sexta-feira,
13 de abril de 1915.
A 16 de
setembro de 1916 casou-se com Maria Ocenira Gomes de Figueiredo (às pressas – a
noiva estava grávida). A cerimônia civil foi realizada às 17 horas e 30 minutos
no Palacete do Foro e a religiosa, a seguir, na Igreja de Nossa Senhora de
Nazareth. O casal teve três filhos: Corina, Alcides e Genuíno. Ela era filha de
Genuíno Amazonas de Figueiredo e de Maria Gomes Figueiredo. Genuíno Amazonas de
Figueiredo foi senador, tendo ocupado a 2ª vice presidência da Mesa do Senado;
membro do Partido Republicano, desde a cisão de 1897; colaborador do jornal Pará, órgão do citado partido; lente da
Faculdade Livre de Direito do Pará; secretário de Estado do Interior, Justiça e
Instrução Pública, durante a maior parte do período de Governo do Dr. Augusto
Montenegro; diretor do Ginásio Paes de Andrade.
Em 1917, publicou Vida Obscura, segundo livro de poesia, que adquiriu grande
aceitação no meio literário. Segundo a crítica especializada, Lucídio Freitas
se afirmaria como um dos maiores líricos da poesia piauiense, com versos
sonoros, rítmicos e perfeitos.
No
final de 1917, doente, veio a Teresina repousar por alguns dias. Entretanto, a
atividade literária não permitiu o completo repouso. No início do mês de
dezembro, no jardim público da Praça Rio Branco, proferiu conferência sob o
título Elogio do Heroísmo, versando
sobre a Guerra Mundial. Aglutinador de homens e irradiador de ideias,
Lucídio Freiras foi um dos baluartes na criação da Academia Piauiense de
Letras, a 4 de agosto de 1901, mas só concretizada a 30 de dezembro de 1917.
Conhecida como “Casa de Lucídio Freitas”, teve, nos dez refundadores –
Clodoaldo Freitas (primeiro presidente e pai de Lucídio Freitas), Higino Cunha,
João Pinheiro, Edison Cunha, Jônatas Batista, Celso Pinheiro, Antônio Chaves,
Benedito Aurélio de Freitas (Baurélio Mangabeira) e o próprio Lucídio Freitas -
as cabeças mais abertas do tempo.
A
Academia, segundo ele, nascia no calor das novas ideias.
Ocupou a
cadeira número 9, cujo Patrono é o falecido irmão poeta Alcides Freitas,
tornando-se, depois, Patrono da cadeira de número 23, ocupada por Amélia de
Freitas Beviláqua, Joaquim Raimundo Ferreira Chaves (Mons. Chaves) e,
atualmente, por Teresinha de Jesus Mesquita Queiroz.
Com a saúde abalada pela tuberculose,
retornou a Belém, onde continuou a atividade profissional. A doença agravou-se,
retornando a Teresina por algumas vezes. Na terra natal buscava forças para
enfrentar o mal que tanto atormentava a vida.
Em 1918, foi criada, em Teresina, a
Sociedade Literária Arcádia dos Novos. Lucídio Freitas fez a apresentação e o
elogio da mocidade que a compunha, conforme nota publicada no Jornal do Commércio, do Amazonas, edição
de sexta-feira, 23 de agosto de 1918, primeira página.
Naquele mesmo ano, por concurso público,
assumiu a titularidade da cadeira de Teoria e Prática do Processo Civil e
Comercial na Faculdade de Direito do Pará, cuja direção estava entregue ao
professor Ernesto Chaves. A tese foi publicada em 1919, com o título de Direito Processual.
Portanto, ainda jovem estava com o nome
consolidado no Pará, como poeta, jornalista, magistrado e professor. Imediatamente
se destacou nos meios jurídicos, literários e sociais em razão da cultura
extrema e refinada. Foi secretário da Sociedade dos Homens de Letras do Pará.
A
professora e acadêmica da Academia Piauiense de Letras, que o tem como Patrono
na cadeira número 23, Teresina Queiroz assim o descreveu: “Tornara-se figura
expressiva das vanguardas literárias, ao lado dos sonhadores do momento - José
Maria Leoni, Peregrino Junior, Oswaldo Orico, Genésio Cavalcanti, Eduardo de
Azevedo Ribeiro, os irmãos Cruz Lima, Andrade Queiroz, Martins Napoleão, Nunes
Pereira, Flexa Ribeiro e Álvaro Maia. Além das figuras mais expressivas como
Tito Franco de Almeida, Severino Silva, Rocha Moreira e Remígio Fernandez. E
ainda Raimundo Morais, Paulo Maranhão, Dejard de Mendonça, Eurico Vale, Alves
de Sousa, Luiz Estevão e outros, desiguais em idade, mas não em entusiasmo”.
Raimundo
Morais, no jornal Estado do Pará,
edição de domingo, 29 de maio de 1921, primeira página, sob o título Lucídio Freitas, escreveu: (...) Lucídio
Freitas se constituiu aqui o centro elegante das letras, o Petrônio magnífico
destas tertúlias bizarras, onde o intelectual amado de outras terras, como
Perícles Moraes, vinha ouvir na doce hospedagem, junto duma xícara de chá
fumegante e dum charuto perfumado, as histórias das estrelas e os combates dos
deuses. A sua casa lembrava a casa dum grego ilustre, em cujas salas toda
Atenas ia conversar e aprender ser galante. (...)
O poeta Lucídio Freitas foi descrito
pelo primo Cristino Castelo Branco, como loiro, bonito, amável, simples,
alegre, comunicativo, bem educado, trajando sempre com esmero, causer delicioso, pleno de elegância, de
graça, de espírito, de finura e de distinção, parecendo um ser à parte, baixado
do Olimpo à terra (Castelo Branco, Cristino. Vida Exemplar. Teresina: APL, 1922).
Em 1917,
foi publicado Há uma gota de sangue em
cada poema, de Mário de Andrade, de caráter nitidamente simbolista, sob o
pseudônimo de Mário Sobral. Publicando Paulicéia
Desvairada, em 1922, Mário de Andrade tornou-se guia e “Papa do
Modernismo”.
Como
Mário de Andrade, o poeta Lucídio Freitas publicou, em 1917, Vida Obscura, igualmente simbolista.
Como Mário de Andrade, Lucídio Freitas era poeta da síntese e da busca. Como
Mário de Andrade, Lucídio Freitas acreditava que “O passado é lição para se
meditar, não para / reproduzir” (Artista, in Paulicéia Desvairada).
Era de
ser esperar, portanto, que Lucídio Freitas chegasse a atingir, de todo, a
estética modernista, participando, inclusive, da Semana de Arte Moderna. Mas, o
precoce falecimento, aos 27 anos de idade, a 14 de maio de 1921, tolheu esta
perspectiva. Pouco antes do óbito, por iniciativa do venerando pai,
foi publicado o último livro, Minha Terra.
*****
Ephemeris – semente do modernismo brasileiro: Lucídio
Freitas foi um dos responsáveis pela edição da revista Ephemeris que representou um movimento de renovação cultural em
Belém do Pará e no restante do país. Era mensal, publicada na segunda quinzena
de cada mês. Foram publicados três números. O primeiro saiu a 30 de agosto de
1916. O segundo a 3 de dezembro de 1916. O terceiro número ainda em pesquisa.
Os participantes, entre outros, liam Mallarmé, Rimbaud, Verlaine, Verhaeren e Nietzsche,”
conforme Peregrino Junior, um dos redatores da revista. Estavam sintonizados
com a poética e a filosofia modernas do Brasil e do mundo.
*****
O jornal Estado do Pará, edição de quarta-feira,
26 de julho de 1916, na primeira página, sob o título Ephemeris, destaca: Sob este título, por todo o mês vindouro
começará a circular, em Belém, um mensário literário e científico, de grande
formato, colaborado por literatos e cientistas paraenses e dos outros Estados.
Ephemeris, se realizar o modelo que os seus fundadores
traçaram, vem de encontro às necessidades intelectuais de um grande público,
como o de Belém, que procura inteligentemente pôr-se ao par do que ocorre por
toda parte, encontrando, de passagem literária e ciência, tudo reunido numa
publicação artística e regular, ao alcance de todas as pecúnias.
Ephemeris satisfaz plenamente a esta ideia. No seu texto, de
40 páginas, impresso em papel encorpado, de linho e de grande formato,
colaborarão os mais conhecidos prosadores, poetas e cientistas paraenses,
apenas, e em outro papel, virão as páginas de comentários e notícias
internacionais, crônicas de moda e elegâncias, nótulas e curiosidades
regionais, bibliografia e registro mundanos.
As
senhoritas encontrarão, nas páginas da Ephemeris,
tudo o que de mais moderno registram as publicações elegantes do Rio, da América
do Norte e da Europa.
O público
paraense saberá, com certeza, compensar, com o seu apoio, o esforço que fazem
os fundadores da Ephemeris para dar-lhe um mensário artístico e noticioso,
moderno e variado.
São
fundadores da Ephemeris: Lucídio
Freitas, diretor, Arthur dos Guimarães Bastos, Emílio de Macedo, Curcino Silva,
João Bento de Souza e Andrade Queiroz, redatores.
O Estado do Pará, edição de sexta-feira, 4
de agosto de 1916, página 2, sob o título Ephemeris,
noticiou: Ephemeris – Até o dia 20
deste mês entrará em circulação o primeiro fascículo d’esta grande revista
literária e científica, que está sendo esperada com o maior interesse.
Ephemeris terá 40 páginas de texto e formará volumes de 6 em
6 fascículos. O trabalho material está confiado a uma das mais bem montadas
oficinas tipográficas de Belém, o que vale por uma certeza da sua absoluta
perfeição.
No
primeiro número começará a ser publicado um estudo filológico do professor
Ferreira dos Santos, do mais alto interesse, e destinado, pela sua novidade, ao
maior sucesso.
Entre
outros, colaboram no primeiro número: Paulino de Brito, Augusto Meira, Olavo
Nunes, Arthur dos Guimaraens Bastos, Clodoaldo de Freitas, Tito Franco, Viega
Cabral, Cureino Silva, Alves de Souza, Paula Guimarães, Alfredo Lamartine,
Emílio de Macedo, Remígio Fernandes, cônego João Crolet, Dejard de Mendonça,
Andrade Queiroz.
O Estado do Pará, edição de domingo, 27 de
agosto de 1916, primeira página, sob o título Ephemeris, esclareceu: Ephemeris
– Contratempo imprevisto na composição d’esta revista motivou a demora da sua
saída, que vinha sendo marcada para o dia 20 passado.
Ephemeris, que está sendo aguardada com o mais alto
interesse, circulará impreterivelmente a 30.
O 1º
fascículo da Ephemeris comportará
para cima de 50 páginas de texto, excluídas as páginas apensas de notas e
comentários mundanos.
Em
seguida, publicamos pela ordem de paginação o sumário do 1º fascículo da Ephemeris:
I - Crônica, Alves de Sousa; II - Salomé, Arthur dos Guimaraens Bastos; III
- Lucano e o Estoicismo, Clodoaldo
Freitas; IV - Laus Veneris, Tito
Franco; V - Da virilidade literária, João
Crolet; VI - Smart, Olavo Nunes; VII
- Imagens da vida, Viega Cabral; VIII
- Profissão de Fé, Dejard de Mendonça;
IX - Mulher, Emílio de Macedo; X - Catão e a Morena, José Oiticica; XI - Um Problema Estético, Curcino Silva; XII
- Signos, Augusto Meira; XIII - Dúvidas e Conjecturas sobre a pontuação
tônica de Getulo, Batavo e Incude, Ferreira dos Santos; XIV - No Meu Deliquio Mortal, Franklin
Palmeira; XV - Laura e as suas bonecas,
Paula Guimarães; XVI - Sonho de Angústia,
Albano Vieira; XVII - A Confissão de
Mathias, Quaresma Andrade Queiroz; XVIII - Soneto, Lucídio Freitas.
O Estado do Pará, edição de quarta-feira,
30 de agosto de 1916, primeira página, sob o título Ephemeris, informou: Ephemeris
– Hoje à tarde, nas principais livrarias de Belém será posto à venda o
fascículo 1º do 1º volume d’esta revista, cuja publicação, aguardada com tanta
ansiedade, marca um acontecimento literário da maior importância.
Ephemeris aparece com o intuito altamente louvável de se
tornar o órgão dos intelectuais paraenses, por forma a aproximá-los cada vez
mais do público que, embora os conheça, tem poucas ocasiões de os ler, quase
todos limitando-se às publicações rápidas da imprensa diária.
O interesse
com que é esperada esta revista não deixa dúvidas sobre o sucesso que ela traz.
Ephemeris traz, neste primeiro fascículo, 56 páginas de
texto, excluídas as 8 páginas apenas de notas mundanas.
Depois do
meio dia, pode o público procurar o 1º número de Ephemeris nas livrarias Pará-Chic, Alfacinha, Agência Martins etc.
Eis o
sumário do 1º fascículo da Ephmeris:
Crônica, Alves de Sousa; Salomé, Arthur dos Guimaraens Bastos; Lucano e o Estoicismo, Clodoaldo Freitas; Laus Veneris, Tito Franco; Da
virilidade literária, João Crolet; Smart,
Olavo Nunes; Imagens da vida, Viega
Cabral; Profissão de Fé, Dejard de
Mendonça; Mulher, Emílio de Macedo; Catão e a Morena, José Oiticica; Um Problema Estético, Curcino Silva; Signos, Augusto Meira; Dúvidas e Conjecturas sobre a pontuação
tônica de Getulo, Batavo e Incude, Ferreira dos Santos; No Meu Deliquio Mortal, Franklin
Palmeira; Laura e as suas bonecas, Paula
Guimarães; Sonho de Angústia, Albano
Vieira; A Confissão de Mathias,
Quaresma Andrade Queiroz; Soneto, Lucídio
Freitas; O mundo vai pelo mundo e por
fora do mundo e o Mês Elegante.
O Estado do Pará, edição de quinta-feira,
31 de agosto de 1916, página 2, sob o título Ephemeris, saldou: Ephemeris
– Circulou ontem o fascículo primeiro d’este mensário científico e literário.
Ephemeris vem preencher uma lacuna que se fazia sentir cada
vez mais à falta de uma publicação de moldes modernos onde tivessem entrada
todos os escritores dizendo sobre literatura ou ciência sem as preocupações
menores, que tanto e constantemente têm separado a uns e feito paralisar o
trabalho a outros.
Os
paraenses que se ressentiam da falta de um periódico neste gênero devem dar a Ephemeris todo o seu apoio e toda a sua
simpatia.
A feição
material do novo magazine nada deixa a desejar: impresso nitidamente sobre
papel acetinado, colaborado pelos mais conhecidos literatos do norte, oferece
leitura variada e instrutiva, por forma a satisfazer a todas as exigências, Ephemeris está à venda nas principais
livrarias de Belém, entre outras, Pará-Chic, Alfacinha, Agência Martins,
Livraria Progresso etc.
O Estado do Pará, edição de sexta-feira,
1º de setembro de 1916, página 2, sob o título Ephemeris, noticiou: Ephemeris – Está publicado o primeiro número
d’este grande mensário literário e científico. Comprem a Ephemeris, o mais bem feito mensário do norte, nas livrarias
Pará-Chic, Alfacinha, Progresso, Agência Martins e Standart.
Este
mesmo texto seria repetido nas edições de 2 (páginas 2, 3 e 4) e 3 (páginas 3 e
4) de setembro de 1916.
O Jornal, do Maranhão, edição de
terça-feira, 26 de setembro de 1916, página 4, sob o título Ephemeris, publicou: Ephemeris
– A última mala trouxe-nos a agradabilíssima visita da revista Ephemeris, mensário que apareceu o mês
passado em Belém do Pará, dirigida pelos homens de letras daquela capital
Arthur Guimaraens Bastos, Lucídio Freitas, Andrade Queiroz, Curcino Silva,
Emílio de Macedo e João Bento de Souza.
Constituindo
um elegante fascículo de 56 páginas, o número inicial surge duma feita
artística cuidada e atraente.
Alves de
Souza, o artista impecável da prosa, apresenta a revista, prevendo, na sua
apresentação, um novo elemento da cordialidade fraternal! Em seguida, Ephemeris traz esta seleta súmula:
Salomé, Arthur dos Guimaraens Bastos; Lucano e o Estoicismo, Clodoaldo
Freitas; Laus Veneris, Tito Franco; Da virilidade literária, João Crolet; Smart, Olavo Nunes; Imagens da vida, Viega Cabral; Profissão de Fé, Dejard de Mendonça; Mulher, Emílio de Macedo; Catão
e a Morena, José Oiticica; Um
Problema Estético, Curcino Silva; Signos,
Augusto Meira; Dúvidas e Conjecturas
sobre a pontuação tônica de Getulo, Batavo e Incude, Ferreira dos Santos; No Meu Deliquio Mortal, Franklin
Palmeira; Laura e as suas bonecas,
Paula Guimarães; Sonho de Angústia,
Albano Vieira; A Confissão de Mathias,
Quaresma Andrade Queiroz; Soneto, Lucídio
Freitas; O mundo vai pelo mundo e por
fora do mundo e o Mês Elegante.
É
correspondente epistolar da Ephemeris
no Maranhão o nosso confrade Astolfo Marques.
*****
O número
2 da Ephemeris também mereceu
destaque na imprensa paraense.
O Estado do Pará, edição de sábado de 30
de setembro de 1916, página 4, sob o título Ephemeris,
noticiou: Ephemeris – Circulará por
estes dias o fascículo 2º d’esta revista que obteve um tão ruidoso sucesso.
Ephemeris, que está sendo feita numa das melhores oficinas
de obras d’esta capital, trará perto de 60 páginas de texto, excluídas as de
anúncio e comentários mundanos e elegantes, devidos à pena brilhante do
conhecido cronista da imprensa diária.
Eis o
sumário do segundo fascículo d’este belo mensário:
I – Crônica, Alves de Souza; II – Brasil, Luiz Guimarães Filho; III – Vita Nuova, Alfredo Lamartine; IV – Dentro da Sombra, Nunes Pereira; V – O Conceito de Biologia, Acylino de Leão;
VI – O Romance de um Secretário de
Legação, Arthur dos Guimaraens Bastos; VII – Cantares, Olavo Nunes; VIII – Machiavel
e Bismarck, Mecenas Dourado; IX – Dúvidas
e Conjunturas Sobre a Acentuação Tônica de Getulo, Batavo e Incude,
Ferreira dos Santos; X - Na Aza do meu
Delírio, Franklin Palmeira; XI – Um
Jornalista do Tempo de Perícles, João Crolet; XII - Atavismo Latino, Angyone Costa; XIII – Signos, Augusto Meira; XIV – Lucano
e o Estoicismo, Clodoaldo Freitas; XV – O
que vai pelo mundo e por fora do mundo, direção.
O Estado do Pará, edição de domingo, 3 de
dezembro de 1916, página 2, sob o título Ephemeris,
anunciou: Ephemeris – Desde hoje
começa a ser vendido nas principais livrarias d’esta capital o número II d’este
brilhante mensário.
Se o I
número da Ephemeris lhe deu o alto
lugar que ela goza entre as publicações congêneres do país, este segundo número
ainda mais confirmará este favor da opinião inteligente dos leitores, como
facilmente se depreende do seguinte esplêndido sumário:
I – Crônica, Alves de Souza; II – Brasil, Luiz Guimarães Filho; III – Vita Nuova, Alfredo Lamartine; IV – Dentro da Sombra, Nunes Pereira; V – O Conceito de Biologia, Acylino de Leão;
VI – O Romance de um Secretário de
Legação, Arthur dos Guimaraens Bastos; VII – Cantares, Olavo Nunes; VIII – Machiavel
e Bismarck, Mecenas Dourado; IX – Dúvidas
e Conjunturas Sobre a Acentuação Tônica de Getulo, Batavo e Incude,
Ferreira dos Santos; X - Na Aza do meu
Delírio, Franklin Palmeira; XI – Um
Jornalista do Tempo de Perícles, João Crolet; XII - Atavismo Latino, Angyone Costa; XIII – Signos, Augusto Meira; XIV –
Lucano e o Estoicismo, Clodoaldo Freitas.
Ephemeris é vendida nas mais frequentes livrarias de Belém,
entre outras: Agência Martins, Alfacinha, Pará-Chic, Livraria Cruz, Agência
Standart etc.
*****
Sobre
Ephemeris, nos dias de hoje, nos fala
o professor Aldrin Moura de Figueiredo, do Programa de Pós-Graduação em
História da Universidade Federal do Pará, no artigo De Pinceis e Letras: os manifestos literários e visuais no Modernismo
Amazônico na Década de 1920: publicado na Revista Territórios & Fronteiras, Cuiabá, vol. 9, n. 2, jul.- dez.,
2016: Outra modernidade - Sob o ponto de vista literário as conexões
brasileiras tiveram outros caminhos. No Pará, em 1916, um grupo de literatos
ligados à revista Ephemeris tomaram o
campo da filosofia, da arte e da história como elemento fundante em suas
preocupações intelectuais. Nomes como Arthur dos Guimaraens Bastos, Lucídio
Freitas, Andrade Queiróz, Curcino Silva, Emílio de Macedo e João Bento de Souza
deram o sopro inicial do debate sobre o significado do “moderno” na literatura
e nas artes na seara das letras paraenses. Temas da filosofia e da história
passaram pelo crivo da arte e autores como Henri Bergson (1859-1941) e
Friedrich Nietzsche (1944-1900) tiveram recepção e repercussão nas páginas da
revista (Estes autores não eram novidade entre os paraenses. O crítico José
Veríssimo, radicado no Rio de Janeiro mas com grande interação com seus
conterrâneos do Pará, já havia, desde a primeira década do século comentado as
traduções francesas de Nietzsche. Cf. Veríssimo, José. As ideias literárias de
Nietzsche. Jornal do Commércio. Rio
de Janeiro, 12 de agosto de 1907). Na crônica de abertura do segundo número de Ephemeris, Alves de Sousa construiu um
texto art nouveau com a tentativa de
trazer os movimentos do estilo para a prosa literária. A música Christoph Gluck
e de Beethoven seriam tomadas a partir dos passos da dança e das linguagens do
teatro. Havia também interesse em renovar a leitura dos clássicos. Dizia ele:
“urge guardar alguma cousa desse mundo grego bem antigo”, mas melhor que fosse
pelos pés e pelo movimento de Isadora Duncan (Souza, Alves de. Crônica. Ephemeris. n. 2. Belém, 1916, p.
57-59).
A
universalidade da arte seria o grande tema e o humanismo contemporâneo seria o
principal receptor dos legados culturais do Ocidente. Na segunda década do
século XX, na literatura que se produzia nos círculos paraenses não parecia
claro qualquer debate sobre regionalismo. O “universal” ainda seria a grande
utopia dos artistas. Ephemeris, por
ter sido efêmera, como quiseram seus autores, foi esquecida ou muito pouco
lembrada. O que nos restam são pequenas passagens das memórias de Peregrino
Júnior e Joaquim Inojosa (João Peregrino Júnior, que viveu em Belém entre 1914
e 1920, talvez tenha escrito a primeira memória desse grupo associando-o ao
modernismo nascente. Cf. Peregrino Júnior, J. O movimento modernista. Rio de Janeiro: MEC, 1954. As notas de
Joaquim Inojosa estão espalhadas em muitas de suas publicações, especialmente
em O movimento modernista em Pernambuco.
Rio de Janeiro: Tupy, 1968). Porém, neste mesmo período os literatos paraenses
travam como que um distanciamento do passado próximo, recuperando um passado
mais remoto. 1916 foi o ano que se comemorou o tricentenário de Belém
(1616-1916). As efemérides pátrias e a refundação do Instituto Histórico e
Geográfico do Pará, em 1917, foram parte desse movimento que ecoou pela
literatura, pelas ciências, pela política e também pelas artes visuais.
*****
Peregrino
Junior dá depoimento a respeito da revista
Ephemeris, In O Movimento Modernista - Ministério da
Educação e Cultura, Rio de Janeiro, 1954: “(...) Devo esclarecer desde logo,
porém, que não tomei parte na Semana de arte Moderna. Nunca fui ovelha de
nenhum rebanho. E recusei-me sempre declaradamente a aceitar a tutela dos
caciques literários que comandavam a campanha. Mas fui um ardente
"torcedor" do Modernismo. "Torcedor" e escriba. Jornalista
militante, dispondo primeiro de uma coluna diária no Rio-Jornal, depois no O
Brasil e por fim no O Jornal,
noticiei com probidade e simpatia todos os episódios do movimento,
comentando-os com isenção, e entrevistei todos os seus líderes. Numa série de
entrevistas, que publiquei no O Jornal,
ouvi Graça Aranha, Paulo Prado, Mário de Andrade, Ronald de Carvalho, Manuel
bandeira, Aníbal Machado, Álvaro Moreyra, Carlos Drummond de Andrade (que
respondeu em versos), Emílio Moura, Abgar Renault, entre muitos outros, e
nestas entrevistas - que Aníbal Machado sugeriu fossem reunidas em livro -
estes líderes definiram, cada um do seu ângulo pessoal, a significação, a
importância e os rumos do Modernismo. Manuel Bandeira, embora recebendo-me com
uma queixa: - "Me deixa quieto, Peregrino!" - fixou corajosamente sua
posição em face do Modernismo, do qual foi aliás precursor. Aníbal Machado, que
já naquele tempo anunciava o seu teimosamente inédito João ternura, exprimiu na concisão de uma fórmula feliz a linha
geral da atitude modernista: - ‘Nós não sabemos exatamente o que queremos, mas
sabemos muito bem o que não queremos’.
Fui,
portanto, testemunha dos acontecimentos, e só isto explica e justifica a minha
presença neste ensaio.
Não
experimento por conseguinte constrangimento ou dificuldade em opinar sobre o
Modernismo e seus líderes. Aliás, eu era naquele tempo um simples estudante de
Medicina, recém-chegado do Pará, e trabalhava na imprensa para viver. Era um
"rapaz de jornal", como se dizia então. Mas trazia do Pará uma
lembrança que me tornava o espírito receptivo, apesar da imaturidade, para a
renovação literária que se tentava. Era a lembrança de um movimento de
província, que o Rio desconhecia completamente e que fora anterior ao
Modernismo. Quero referir-me ao movimento do grupo da revista Ephemeris, chefiado por Lucídio Freitas,
Tito Franco, Dejard de Mendonça, Alves de Souza, e que representou uma corajosa
e afoita tentativa provinciana de renovação literária, e que se processou em
1919 - 1920. Quem compulsar a coleção da Ephemeris
- até materialmente original, discreta, diferente - verá que o "grupo
paraense" merecia a atenção dos críticos e dos historiadores literários do
nosso tempo. Este movimento, de resto, mostrava como as sementes do Modernismo
estavam soltas no ar, há longo tempo, esperando apenas condições adequadas para
germinar e frutificar... (...).
Além de
Lucídio Freitas, outros piauienses participaram da revista Ephemeris como o pai
deste Clodoaldo Freitas, e Benedito Martins Napoleão, que introduziu Peregrino
Junior na leitura de Carnaval, de
Manuel Bandeira, o São João Batista do modernismo brasileiro, lançado em 1919.
Após devorar as páginas do livro, revela Peregrino Junior: “Guardei a lição
antecipadora de Debussy”:
Para cá,
para lá...
Para cá,
para lá...
Um
novelozinho de linha...
Para cá,
para lá...
Oscila no
ar pela mão de uma criança
(Vem e
vai...)
Que
delicadamente, quase a adormecer o balança
- Psio...
–
Para cá e
para lá...
Para cá
e...
- o
novelozinho caiu”...
Adiante
Peregrino Junior acrescenta que “Quando sobreveio, em 1922, a Semana de Arte
Moderna, não tive dificuldade nem hesitação em aceitar o Modernismo”.
A Careta, do Rio de Janeiro, edição de 6
de setembro de 1952, página 14, na coluna Um
Sorriso Para Todos, assinada por Sir I (pseudônimo de Peregrino Júnior), apresenta: Exato, minha amiga. Foi precisamente
há trinta anos que um grupo de escritores, poetas e artistas, sob o comando de
Graça Aranha, realizou em S. Paulo, sob o implacável castigo de vaias
homéricas, uma singular experiência intelectual: a Semana de Arte Moderna. A
revolução modernista vinha, porém, mais longe. Tinha, talvez, suas raízes no
primeiro livro de poemas de Manuel Bandeira – Carnaval, e a primeira exposição
de pintura de Anita Malfati. Ao lado disto, em 1916, em Belém do Pará, circulou
uma revista literária – Ephemeris, dirigida por Lucídio Freitas e Tito Franco,
e que revelou ao Brasil a poesia de Verhaeren, que foi precursora incontestável
do movimento modernista, pela sua orientação e pela sua feição. (...)
A mesma Careta, edição de fevereiro de 1954,
página 14, na coluna Um Sorriso Para
Todos, assinado por Sir I (pseudônimo de Peregrino Júnior), edita: Passei este final de semana em Vera Cruz
escutando o rumor das águas claras do Rio Sant’Ana e lendo um grande livro de
poemas: Opus 7, de Martins Napoleão.
(...) Conheço este poeta há cerca de quarenta anos – e há quarenta anos o
estimo e o admiro. O nosso encontrou deu-se quando iniciamos a vida em Belém do
Pará. Osvaldo Orico, Martins Napoleão e eu – frequentando o Ginásio Paes de
Carvalho e as revistas literárias da época. Éramos como três irmãos
identificados na serena fraternidade das inquietações, dos sonhos e dos
projetos. Lucídio Freitas – o poeta que centralizava em Belém a admiração das
novas gerações – animava-nos com a sua simpatia. E, embora sem credenciais para
aparecer nas páginas ilustres de Ephemeris,
nem nas colunas austeras do Folha do
Norte ou do Estado do Pará,
publicava a nossa literaturazinha na Guajarina, e isto nos encantava.
Gravitávamos, assim, em volta dos ídolos literários da época: Lucídio Freitas,
Tito Franco, Raimundo Morais, Alves de Souza, Dejard de Mendonça, Severino
Silva, Angione Costa, Paulo Maranhão ... E no meu Jardim de Melancia – nome
pomposo e romântico de uma pobre mansarda da Rua Manoel Barata, passamos horas
e horas, todos os dias, após a sesta, a discutir literatura, a debater ideias e
livros do momento e analisar pessoas e coisas. Foi nestes encontros que aprendi
a amar o velho Machado e os poetas Verhaeren e Verlaine e conheci o Carnaval, de Manuel Bandeira. Que longos
e inquietos debates, os nossos! E que planos, que ambições, que sonhos! (...)
*****
Lucídio
Freitas teve intensa e brilhante atividade jornalística no Piauí, no Pará e
diversas partes do Brasil. No Piauí, colaborando com os jornais A Notícia, Diário do Piauí, O Norte,
e O Piauí. No Pará, com o jornal o Estado do Pará, a revista Guajarina e
outros. No Rio de Janeiro, com a revista Fon-Fon.
Além de Alexandrinos (1912), em parceria com o
seu irmão Alcides Freitas, e Vida Obscura
(1917), publicou, no campo do Direito,
Questões Processuais.
Espírito
inquieto, era um homem além do tempo. É necessário que se faça estudos com
olhos mais abertos sobre Lucídio Freitas e suas produções literárias. Quem se
habilita?
Kenard
Kruel* Jornalista e escritor.
Um pouco da poesia de Lucídio Freitas
O Incêndio
O ar queima, o vento queima, a terra queima e abrasa.
Ondas rubras de Sol batem fortes na areia...
No espaço nem sequer um leve ruflo de asa,
Passa aos beijos do Sol que fustiga e esbraseia.
Fogo de um lado e de outro e o vento o incêndio ateia,
Da planície a fazer vasto lençol de brasa;
E o fogo sobe e desce, e volta, e mais se alteia,
E abraça e beija, e morde a ossatura da casa.
Nisto um grande rumor pela terra se escuta.
Braços abertos no ar, soluçando, o Castelo,
Se desmorona, enfim, depois de estranha luta.
Velho Castelo Real! Ó sombra de outra idade!...
Lembras hoje, depois desse horrível flagelo,
As ruínas de Sol no poente da Saudade!...
Teresina apagou-se
Teresina apagou-se na distância,
Ficou longe de mim, adormecida,
Guardando a alma de sol da minha infância
E o minuto melhor da minha vida.
E eu sigo, e eu vou para a perpétua lida.
Espera-me, distante, uma outra estância...
É a parada da luta indefinida,
É a minha febre, minha dor, minha ânsia...
Como são infinitos os caminhos!
E como agora estou tão diferente,
Carregado de angústias e de espinhos!...
Tudo me desconhece. Ingrata é a terra.
O céu é feio. E eu sigo para a frente
Como quem vai seguindo para a guerra...
Perscrutadoramente
Perscrutadoramente os olhos ponho
No que fui, no que sou, no que hei de ser,
E alucinado dentro do meu sonho
Sinto a inutilidade do nascer.
Minha origem componho e recomponho.
Venho do berço ao túmulo... viver
Um instante só, e após, ermo e tristonho,
Sob o ventre da terra apodrecer.
Homem - parcela humilde, humilde e obscura,
Que anda perdida e desapercebida
Buscando os vermes de uma sepultura -
O que foste? O que és? Para onde vais?
Esta angústia maldita da tua vida
Foi a maldita angústia dos teus Pais!
A Meu Pai
Esqueço todo bem que, em minha estrada,
Prodigamente, como um Deus, semeio,
Fazendo meu o sofrimento alheio,
Amparando toda alma abandonada.
Quantas e quantas vezes tenho em meio
Da vida, dentro a noite erma e gelada,
Confortado a velhice desgraçada
Na mornidão amiga do meu seio!
Para servir aos meus irmãos padeço
E dou-lhes a água e o pão, o teto e o leito
E o beijo que consola e que bendiz...
Mas todo bem que faço logo esqueço
Para guardar apenas no meu peito,
A saudade de um bem que eu nunca fiz...
2 comentários:
Sem querer inticar, mas já inticando, é preciso saber se o "grande incentivador de valores novos" atribuído a Coelho Neto se refere apenas à idade. Porque Coelho Neto, segundo Oswald de Andrade, era, esteticamente, Coelho Avô. Ou seja, Coelho Neto era a cara encarnada e esculpida do ranço acadêmico ou, se preferirem a vox populi, a cara cagada e cuspida. É o que dá escrever sem precisão...
Eu instigo, este Coelho Neto nunca foi incentivador de valores novos, pelo contrário, sempre respirou a velharia acadêmica dos sapos-tanoeiros de então. É preciso, neste momento, pesquisar mais sobre a velharia acadêmica do início do Século XX que ficaram ainda por muitos anos na trincheira de todos os conservadorismos: estéticos ou não, enquanto o mundo rodava na sua máquina de progresso e luz.
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