segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Sanguim

Eu estudei no Ginásio Clóvis Salgado, na Praça da Santa Casa, em Parnaíba. Era diretora a professora Maria da Penha Fontes e Silva, que lecionava a disciplina de História. Secretária a Rita Portela. Bedel, o senhor Galo. Professores, entre eles, Maria Teresa de Albuquerque, de Português. Poucas vezes em minha vida conheci pessoa mais humana, educada, dedicada, compreensiva, solidária. Cada aluno era um filho. E que grande amor nos dava. Como sempre gostei de ler, frequentava muito a casa dela, perto do Mercado Central, na Rua Dr. Francisco Correia. Li todos os livros da biblioteca dela. Ficávamos horas e horas conversando sobre literatura, as manhas do Português, disciplina que ela dominava como ninguém. Não tínhamos medo do Português, porque o Português era a professora Teresa do Sanguim. Um anjo em pessoa na terra. O seu Sanguim, de nome Raimundo Nonato de Albuquerque, esposo (olha a escritora Vanessa Trajano fazendo escola) da professora Teresa, era um boêmio incorrigível. Mas ela o amava como ele era. Dizia-se corretor. E garantia que era o melhor vendedor do mundo. E eu acrescentava: não só deste mundo, mas de todos os mundos. Um dia tentou me vender uma estrela. E, por pouco não a comprei. A Tereza Rochane, filha dele, chegou na hora e tirou-me toda a atenção. Outro dia soube que o meu amigo e mecenas Joca Vidal, dono do Aventur Café E Restaurante, o melhor do Principado do Portos das Barcas, tinha tentando comprar dele a Ponte Simplício Dias da Silva. A Susana Tavares Silva, filho do Alberto Silva, construtor da ponte e moradora da Ilha, comprou-a primeiro. A partir de então, Joca Vidal passou a ser crítico da ponte que, segundo ele, não recebe o devido tratamento por parte do governador Wellington Dias, do PT, que ele odeia mais do que os donos do Torquália. Um dia explicarei esta guerra sonora, que já envolveu até o sonoplasta José Dantas. Sanguim, pela manhã, passava o tempo jogando sinuca no secular Bar Parnaíba, perto da Praça da Gracinha. À tarde, por volta das cinco horas, colocava uma cadeira na calçada da casa, e ficava lá fumando e vendo, principalmente, os rabos de saia passarem entre as fumaças dos cigarros. À noite, bem, não vou entrar na intimidade do Sanguim. De tão popular, o convenceram a disputar uma cadeira na Câmara Municipal. O slogan: ruim por ruim, vote em Sanguim, não convenceu. Parnaíba perdeu o que seria um grande fazedor de leis do menor esforço. Sanguim faleceu, parece-me, no dia 2 de junho do ano findo. Apesar de frequentar a casa dele por vários anos, nunca trocarmos uma palavra. Creio que por ciúmes que ele tinha de mim com a esposa dele que, convenhamos, era uma bela e cativante mulher e que mereceu da parte do poeta muitos poemas da escola romântica de Castro Alves. O Helder Fontenele, com a postagens destas fotos que ele posta dos seus arquivos implacáveis, me faz lembrar de coisas da minha juvenília em Parnaíba. Estejam em bons lugares, professora Teresa e seu Sanguim. Com fé, esperança e amor.

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