quinta-feira, 22 de julho de 2010

Gisleno Feitosa

Gisleno Feitosa. Foto de Kenard Kruel.

Dilson Lages entrevistou o médico, poeta e escritor Gisleno Feitosa, imortal da Academia de Letras do Vale do Longá, sediada em Barras. Confira a entrevista abaixo:

Dílson Lages – Sua poesia procura antes de tudo resignificar a linguagem nordestina. Para alcançar esse fim, como ocorre o processo de criação literária de Gisleno Feitosa?
Desde criança sou aficionado por livros. Fui seminarista, em Fortaleza, “mastiguei” muito Latim com o Padre Gumercindo e convivi com a gente humilde da Lagoa Redonda e isso me estimulou a criar algo que trouxesse à tona o modo de ser do povo sofrido e resignado do nordeste. Daí pra cá, fui juntando os termos que ouvia como médico em Barras e mesmo aqui em Teresina. Por fim resolvi publicá-los; não como crítica, mas como homenagem a este irmão ou irmã, angustiado pelo dor e pela injustiça social. Creio que o linguajar caboclo não pode desaparecer. Alguém tem que tentar perpetuá-lo.

Dílson Lages – Em Gisleno Feitosa… em verso e prosa desfila grande número de termos regionais. O que esses termos dizem sobre o Piauí e os piauienses?
No meu modo de ver, traduzem fidedignamente o sentimento deste povo bondoso e humilde. Lembro que ao atender o primeiro paciente em Barras do Marataoan fui surpreendido com a solicitação de que prescrevesse um “cachet”. Desnorteado, procurei apoio no saudoso mestre Zé Lages que, sorrindo, explicou que se tratava de comprimido. O doutorzinho recebia ali uma lição de francês do caboclo das brenhas.

Dílson Lages – O senhor tem feito da poesia um instrumento de divulgação da medicina. É possível conciliar medicina e poesia, sem prejuízos à dimensão estética da linguagem literária?
Se prejudica a linguagem literária não sei; que ajuda a humanizar a medicina, tenho certeza. Sou adepto da máxima do médico espanhol José Letamendi que diz: “o médico que só sabe Medicina, nem Medicina sabe”. Através de meus textos, fico mais próximo da clientela; explico o desenrolar das patologias sem o cientificismo peculiar do “mediquês”, transmitindo mais segurança e confiança.

Dílson Lages – Em sua poesia, a sátira é recorrente. Nela, o senhor critica costumes e desvarios de nosso tempo. Dá pra acreditar que a literatura serve para transformar alguma coisa?
A Literatura é um instrumento de comunicação e de interação social, pois cumpre o papel de transmitir os conhecimentos e a cultura de uma comunidade. O enciclopedista e acadêmico Antônio Houaiss disse certa vez que: “A literatura é de uma relevância transcendente, porque ela é o grande espelho da vida. O único documental real da história é a literatura”.

Dílson Lages – Humor é a marca registrada do estilo de Gisleno Feitosa. Como o senhor procede para criar o humor que tanto individualiza sua escrita?
Digo no meu livro que a proximidade com os outros seres humanos, o convívio diuturno com o sofrimento, o compromisso inalienável com a vida, facilitam a inspiração e a intuição. Quem convive permanentemente em meio a dor e ao sofrimento tem que procurar uma válvula de escape ou se torna mais estressado que o próprio paciente. É ai que o humor tem vez. Aprende-se isso com a vivência em consultórios e centros cirúrgicos.

Dílson Lages – O que os leitores encontram em seu recente livro Gisleno Feitosa… em verso e prosa?
Na verdade, quando pensei em criar esta obra tinha o intuito de entreter os pacientes na sala de espera de meu consultório. Coloquei textos instrutivos em meio a outros engraçados a fim de tornar menos enfadonha a longa espera pelo atendimento.

Dílson Lages – Gisleno Feitosa… em verso e prosa cumpre uma função bastante didática. O que é possível aprender nessa obra?
Não tive em momento algum o intuito de ensinar nada a quem quer que fosse. Tudo começou como uma brincadeira de quem gosta de ler e que sente na pele a carência premente de afeto, mais do que de , nas pessoas, nos dias atuais. Não sei se fiz bem em publicar o livreto, mas comungo com o grande mestre Darcy Ribeiro quando preceitua: “Algumas pessoas podem rir de mim porque eu tentei e não consegui, mas com certeza eu rirei muito mais porque elas nunca tentaram”.

2 comentários:

GISLENO disse...

Obrigado por incluir esta matéria em sua página. Sou um leitor habitual tanto dela quanto das sugestões na "orelha", ao lado.
Confesso-me um admirador de sua luta incessante em prol da cultura de nosso povo. Você é um batalhador!

Kenard Kruel disse...

mestre, a kenard kaverna é sua. entre sempre quando quiser. eu que agradeço a honra de postar material sobre o senhor, que é do meu máximo gostar e profundo bem querer.