sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Piripiri - terra de buganvílias e madressilvas

Pedro de Moraes Freitas, o poeta Baurélio Mangabeira e um casal de crianças (desconhecidas). Foto do acervo de Francisco Newton Freitas.


Piripiri é uma aprazível e bucólica cidade, como já disse em outra oportunidade e aqui repito com mais ênfase ainda. A esta comuna sou ligado através dos estreitos laços de sangue dos meus ancestrais e parentes. Terra das buganvílias e madressilvas, como a cognominou a professora universitária Cléa Rezende Neves de Melo, a pessoa que, sem favor algum, mais vem fazendo pela preservação da memória histórica e cultural desta terra, celeiro amplo e abarrotado de importantes figuras que se destacam no cenário histórico do Piauí, tanto na política como na magistratura, nas artes, na música, na literatura e no humor.

Entre esses luminares da cultura, do jornalismo, da literatura e da poesia, gostaria de lembrar, apenas como uma pequena amostragem ilustrativa desse celeiro artístico, que é Piripiri, do nome do grande poeta Baurélio Mangabeira, membro da Academia Piauiense de Letras. Menestrel de versos muitas vezes satíricos, jornalista destemido, perambulava por diferentes paragens com a sua imprensa itinerante, como um verdadeiro cigano do jornalismo e da poesia. Boêmio e inquieto, fez uma viagem a Oeiras, a cavalo, com a finalidade de visitar o seu amigo e poeta Nogueira Tapety, que se encontrava doente de tuberculose, então doença muito temida, apenas para palestrar e tomar – quem sabe? – umas boas talagadas da branquinha.

Dizem os doutos e entendidos que a palavra Piripiri, etimologicamente, provém de certo tipo de capim que havia na região. Assim, Piripiri, em sua assonância pitoresca e exótica, em sua singularidade lúdica e telúrica, já lembra o bucolismo da paisagem em que foi fundada e a paisagem em seu derredor. Cidade cortada pelo Rio dos Matos, já florido em seu próprio nome e pelas árvores que se debruçam sobre seu leito, formando um túnel de ramas ou uma alameda fluvial. Fernando Pessoa dizia que o Rio Tejo era mais bonito que o rio que banhava sua aldeia, mas que o Rio Tejo não era mais bonito que o rio que cortava sua aldeia porque o Rio Tejo não era o rio de sua aldeia. Dessa forma, como Piripiri para os piripirienses é a capital do mundo, do mesmo modo o Rio dos Matos, como no poema pessoano, é o mais bonito rio do universo.

O poeta João Ferry, amigo do poeta Osíris Neves de Mello (sobre quem já me detive em longo estudo), que bem merecia ter um logradouro com o seu nome, se é que já não o tem, cantou todo o encantamento deste torrão no poema que leva o seu nome – Piripiri. Cantou os pau-d’arcos floridos, derramando suas flores de ouro, como lustres soberbos de góticas catedrais. Exaltou o belo bucolismo da Fonte dos Matos, do Recreio, do Mocozal, do Paciência e do Mosquito, no exotismo engraçado desses nomes, que nos fazem viajar nas asas poderosas do pensamento e da saudade. Nesse périplo poético nos deparamos com o Riacho Cabresto, que certamente só tem rédeas nos verões das secas inclementes, mas creio ser indomável nas invernadas das chuvas, nos tempos felizes das cachoeiras, da fartura e do verde reverdecido em verde cada vez mais verde. O Garibalde de tantas recordações, de tantas conversas, de tantos sonhos que se concretizaram em realidade e de outros que se derruíram em desilusões e irrealizações. Açude Anajás, Flor dos Campos e Rio dos Matos, já nos trazem evocações líricas e bucólicas na poesia de seus nomes, que cheiram a terra molhada e a flores silvestres. O primeiro é um céu a retratar outro céu, na ressonância da imagem dacostiana; o segundo faz lembrar um campo matizado de flores do campo, flores simples, flores humildes, flores incultas, jamais encontráveis nos jardins dos palácios e das mansões, porque apenas cultivadas pelo Supremo jardineiro que as criou; e o Rio dos Matos, filho dos matos, na sugestão de seu nome floral.

Por fim, a evocação dos festejos de Nossa Senhora dos Remédios, onde tantos buscaram remédio para seus males, nas promessas da esperança e da fé, onde tantos namoros foram deflagrados, na cumplicidade dos olhares, onde a saudade nascia das bocas das amplificadoras, nas músicas e nos recados do locutor, onde corações eram arrematados nas quermesses dos apaixonados, onde prendas eram leiloadas nas quermesses dos devotos, para as obras da Igreja e ajuda aos necessitados.

3 comentários:

AirtonSampaio disse...

O problema continua sendo o olvido à lição do Poeta Carlos Drummond de Andrade: "Não cante sua cidade, deixe-a em paz."

Anônimo disse...

Vai procurar o que fazer Airton e deixa o cara escrever o que quiser. Tu sabe escrever, coitado!

AirtonSampaio disse...

Puxa, que português maravilhoso esse de quem não tem nem coragem de se identificar... Ah, quando CDA pediu "não cantes tua cidade, deixa-a em paz", ele não queria impedir ninguém de escrever, mas apenas poupar as pobres cidades de tantas tolices que se dedicam a elas. Custa atender ao Poeta?