sábado, 20 de outubro de 2012

Um pouco da nossa história política

José da Rocha Furtado,
eleito em 1947, após redemocratização

Tony Rodrigues

Desde 1947 foram realizadas 12 eleições no Piauí para governador de Estado. A oposição venceu oito delas. Os governistas ganharam apenas quatro e em situações muito específicas.

Em 1947, logo após a remocratização com o fim do Estado Novo, foi eleito o médico José da Rocha Furtado, que era funcionário da Santa Casa de Misericórdia. Ele não era político e nunca em sua vida pensou sequer em ser vereador quanto mais governador, como confidenciou pouco antes de morrer ao jornalista José Lopes dos Santos, cronista da história política do Piauí. Os dois já morreram.

Furtado era cearense de nascimento e vivia em Teresina por circunstâncias de natureza profissional. Precisava ganhar a vida. Ganhou também uma eleição. No entanto, sua gestão foi marcada pelo desastre da arrogância e da perseguição política – tanto de um lado quanto de outro.

Ele não detinha a maioria no Parlamento. Com isso, seus opositores faziam a festa. Rejeitavam todos os seus projetos. O clima foi marcado, sempre, pela animosidade profunda entre os combatentes. Naquele tempo, a arena política era um combate autêntico, com direito a armas de fogo e tudo o mais.

O clima era de filme de faroeste. Os deputados compareciam ao plenário da Assembleia, que funcionava perto da praça da Bandeira, onde hoje é a Fundação Cultural do Estado, armados até os dentes. Deles que faziam questão de exigir os canos dos trabucos enfiados no cós das calças.

Ninguém se atrevesse em contestar opiniões enquanto alguém estava discursando, sobretudo se fosse da oposição, que era em maior número e estava a postos para dar a maior coça nos parlamentares governistas caso fosse necessário.

Os discursos eram inflamados e agressivos. Rocha Furtado mandou muitos funcionários ligados ao seu adversário para trabalhar em lugares remotos. As transferências eram feitas sem qualquer justificativa. Apenas para atingir seus desafetos na carne.

Chagas Rodrigues,
eleito governador em função de uma tragédia

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O falecido deputado Humberto Reis da Silveira contou ao jornalista Toni Rodrigues, pouco antes de morrer, que o clima era muito pesado. Ele era bem jovem na época e residia numa pensão próximo à praça Rio Branco. Todos os dias mudava o itinerário no percurso até o plenário do Legislativo porque havia rumores de que pistoleiros a serviço do governo infestavam as ruas para provocar os deputados opositores, ante sua passagem, e com isso provocar uma briga para chegar às últimas consequências.

Na gestão de Rocha Furtado foi votada a Constituição Estadual. Os deputados tiveram que promulgá-la aquartelados na Guarnição Federal e sob proteção do Exército. A mesma denúncia de que bandoleiros a serviço de Karnak queriam tumultuar o processo, prejudicando a votação.

Em 1950, nova eleição. O eleito foi Pedro Freitas, oligarca de José de Freitas, a 50 e tantos quilômetros de Teresina. Comerciante, riquíssimo, era figura simples, de oposição.

Certa feita, ao chegar no palácio, esqueceu-se das chaves. O militar que estava fazendo a segurança não o conhecia, nunca o tinha visto pessoalmente, e duvidou que ele fosse o governador, como afirmava.

Pedro Freitas pediu apenas que ele chamasse o chefe do gabinete militar, que o conhecia e autorizaria a sua entrada. O policial se desmanchou em desculpas, mas nem foi preciso porque Pedro Freitas não levou o fato em consideração. Tinha consciência de que não era nenhuma celebridade.

Petrônio Portella,
eleito pela oposição e quase presidente da República

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Foi um dos poucos que fizeram sucessor. Conseguiu eleger seu genro, o General Gayoso, que fez um governo sem muitas realizações num tempo em que o Brasil tinha pressa. Eram os anos Juscelino Kubitschek, cinquenta anos em cinco – a marcha célere do desenvolvimento.

Em 1959, Chagas Rodrigues, jovem deputado federal, elegeu-se beneficiado por uma tragédia. Um acidente de carro tirou a vida do candidato a governador da oposição Demerval Lobão e do candidato a senador Marcos Parente. Chagas foi eleito para o governo e Joaquim Parente para o Senado.

Foi um governo de realizações. Criou-se o Banco do Estado, o Serviço Social, estradas, escolas, hospitais. Mas Chagas enfrentou feroz oposição de um especialista no assunto, o então prefeito de Teresina, Petrônio Portella, que na condição de deputado estadual já fizera combate ao sogro, Pedro Freitas, no começo da década anterior.

Humberto Reis
clima de enfrentamento entre adversários nos anos 1940

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Hábil articulador, Petrônio foi vitorioso contra o candidato do governador, Constantino Pereira de Sousa. Foi surpreendido pela ditadura militar.

Tentou liderar movimento contra o golpe de 1964 mas foi desaconselhado pelos seus aliados em Brasília: era irreversível a tomada de poder pelos militares. Tornou-se um dos mais expressivos interlocutores civis da ditadura e chegou a ser cotado para presidente da República na sucessão de João Baptista Figueiredo (1979-1985), de quem foi ministro da Justiça. Morreu antes, fulminado por um enfarte.

No período militar foram quatro governadores, todos nomeados: Helvídio Nunes, em 1966; Alberto Silva, em 1970; Dirceu Arcoverde, em 1975; e Lucídio Portella, em 1979.

Com o retorno das eleições diretas, em 1982, Lucidão, como era chamado entre seus seguidores, conseguiu fazer o sucessor, o jovem deputado federal Hugo Napoleão, que mais tarde seria senador da República e novamente governador pela via judicial.

Os bastidores da sucessão de Lucício Portella registraram uma disputa ferrenha pela indicação de candidatura. Disputavam o empresário e ex-secretário de Fazenda, Ari Magalhães, e o próprio Hugo.

Lucídio recomendou aos seus partidários que fossem em busca de se viabilizar. Magalhães disse que tinha mais colégios em seu favor. O governador preferiu Hugo por ser jovem e de boa aparência, a característica considerada essencial para derrotar o mítico Alberto Silva, que estava com a corda toda.

Por causa disso, por ter sido preterido em favor de Hugo Napoleão, Ari Magalhães nunca perdoou Lucídio Portella. Os dois não se falam até hoje, conforme revelou o próprio Magalhães, em oportunidade recente, numa conversa com os jornalistas Toni Rodrigues e Kenard Kruel em movimentada livraria da capital.

Foram realizadas, em seguida, seis eleições. A oposição ganharia quatro delas. Em 1986, com Alberto Silva. Em 1990, com Freitas Neto. Em 1994, com Mão Santa. E em 2002, com Wellington Dias. Em 1998 e 2006, como ressaltamos no início, houve eleições atípicas. Os candidatos eram governadores e estavam disputando no exercício do mandato.

Um deles, Mão Santa, foi cassado por abuso de poder político durante a campanha reeleitoral. O outro, Dias, foi multado pelas mesmas razões, com uma ressalva: o abuso, segundo os julgadores, não foi exercido em quantidade tamanha que viesse a ter qualquer influência sobre o pleito.

Toni Rodrigues -repórter, vereador eleito de Altos (PI).

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