sexta-feira, 13 de abril de 2012

Batalha do Jacaré, ou ficar a pátria livre, ou...

Leonardo da Senhora da Dores Castello-Branco.
Arte de Albert Piauí.

Maria do Carmo Fortes de Britto

Mesmo sendo um pequeno povoado sem autonomia política, Piracuruca acompanhou o movimento libertário, não ficou indiferente às lutas pela Independência do Brasil, que culminaram com a nossa separação de Portugal. 

A Vila da Parnaíba, em 12 de outubro de 1822, foi a primeira a tomar conhecimento da Independência do Brasil, isto porque, sendo porto, as notícias muitas vezes chegavam por lá antes do restante da Província. 

Assim sendo, foi a primeira localidade piauiense a tornar-se solidária ao jovem Imperador do Brasil, Dom Pedro I, apoiando seu ato de declaração à Independência do Brasil. 

A rebeldia dos parnaibanos não passou despercebida às autoridades que defendiam a lealdade a Portugal. Imediatamente uma tropa armada foi enviada para combater os rebeldes, sob o comando do Major João José da Cunha Fidié que, dirigindo-se a Parnaíba, passou por Piracuruca a 25 de novembro do mesmo ano, deixando uma guarnição militar e continuou viagem, chegando a Parnaíba a 12 de dezembro. 

Os líderes parnaibanos, num plano tático, retiraram-se para o Ceará em busca de reforços militares. 

Major Fidié, ao passar por Piracuruca em direção a Parnaíba, não vinha sozinho, trazia um batalhão de soldados fiéis à Coroa portuguesa. Jureni Machado (Apontamentos Históricos da Piracuruca) "Chegando com uma tropa de 1.800 praças aproximadamente, encontrou o Povoado quase deserto, algumas pessoas foram presas e outras interrogadas". 

Major Fidié ao chegar a Parnaíba encontrou a população perfeitamente calma e ordeira. Aproveitando-se da situação, conclamou os habitantes a se manterem fiéis à Corte Portuguesa. Ordenou que sua tropa formasse em frente à Igreja Matriz e na Câmara dos Conselheiros foi oficializado o juramento de obediência à nação portuguesa. (Idem)

A submissão temporária da vila da Parnaíba serviu de propaganda negativa aos ideais de autonomia libertária do povo do norte piauiense. 

Se Piracuruca e outras povoações tomaram conhecimento daqueles fatos, podem ter julgado que o certo seria a continuidade do governo colonial. 

Em 22 de janeiro de 1823, a Junta Provisória do governo fiel a Portugal expediu uma declaração aos piauienses: "Vós não tendes proporções para a independência; falta-vos agricultura, ciências, manufaturados, comércio, dinheiro e sobretudo Exército e Marinha". Pereira da Costa (Cronologia Histórica do Piauí). 

Por coincidência, naquele mesmo dia o povoado de Piracuruca deu a resposta histórica pela voz de Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco, que entrou no povoado com as forças por ele comandadas. Encontrando o povoado quase desabitado, fruto da desinformação dos seus habitantes, fez da guarnição encarregada de manter a ordem no povoado sua prisioneira. Reuniu os poucos moradores da povoação e os prisioneiros em frente à igreja matriz e ali mesmo leu um manifesto de apoio à Independência do Brasil. Anísio Britto (Município de Piracuruca 1922). 

Não é somente Anísio Britto que se reporta a esse fato. Benjamin de Moura Baptista, membro do Instituto Histórico e Geographico Piauhyense (O Piauhy 1920), registra: "Em 22 de Janeiro de 1823, as forças sob o comando do inteligente e altivo patriota Leonardo de Carvalho C. Branco fazem a proclamação da independência em Piracuruca". 

Cabe, agora, narrar a ação de Leonardo da Senhora das Dores Castello-Branco (Leonardo de Carvalho Castello Branco) relativamente a Piracuruca. Achava-se no Ceará o ardoroso patriota, e, conseguindo ali reforços, dirigiu-se à povoação de Piracuruca, que tomou a 22 de janeiro de 1823, proclamando a independência, ali, redigindo esta proclamação (Dr. Luiz Antônio Vieira da Silva "História da Independência do Maranhão)". 

"Queridos irmãos que habitais as fecundas margens do caudaloso Parnaíba, por um e outro lado, dignai-vos atender às sinceras vozes de um Patrício vosso, que, todo, unicamente se dedica ao vosso bem presente e ainda mesmo no futuro. 

"Até quando, malignas e espessas nuvens ofuscam as luzes do vosso entendimento, pois vós sois Brasileiros, e recusais obedecer ao Sr. D. Pedro, Imperador Constitucional e seu Perpétuo Defensor? - 

"Não sois europeus e seguis o seu partido com perigo evidente da vossa vida e com perda da honra. Ah! Onde estão o brio e o patriotismo brasilienses; onde a honra e onde o dever? "O meu coração se vê dilacerado pelo punhal da mais intensa dor! 

"lrmãos, Irmãos! Quereis ter a doçura que a força exigia de vós e por violência obtenha o que o dever, a honra e o patriotismo em vão, até agora, vos tem tão instante e cordialmente persuadido! A dor me embarga as vozes do sentimento, apenas respiro. 

"quereis que a vossa adesão à nossa santa e comum causa seja da força! Pois sereis satisfeitos, - Ei-la: ela se apresenta. Um pé de exercito de quarto a seis mil homens vai fazer o mesmo em Campo Maior; há mais um corpo de observação para conter o inimigo, a quem inquieta com contínuas correrias pela costa. Todos eles trazem os petrechos de guerra e várias peças de campanha, que tomam mais terríveis suas forças. Além destes corpos, um batalhão ligeiro de índios e brancos de mais 600 praças, destinado a cortar as relações do inimigo com o sul da província, ali plantou o seu quartel comandante pela voluntária reunião dos povos circunvizinhos. 

"No curto espaço de três dias tem visto crescer o duplo dos seus soldados. 

"Obtida a possível reunião dessas forças mencionadas,! seguros da vitória, marcharemos alegres a desalojar o nosso tirano déspota do seu último mal seguro asilo... 

"Ele não ignora a sua fraqueza; a deserção da sua tropa aumenta o temor. Conseguinte a este conhecimento, o seu pesar se patenteia por três cartas escritas a seus amigos de Campo Maior e Oeiras e por um oficio dirigido às autoridades de Caxias, pedindo socorro, todos esses papéis nos vieram às mãos por serem tomados pelos nossos soldados da guarda avançada. Concluída esta expedição, o que esperamos em brevíssimos dias, a não termos mais que fazer, exultando de gosto por sermos instrumentos da liberdade de nossos irmãos, cantando alegres hinos ao Senhor Deus dos Exércitos, entre os vivas e aclamações, ufanos entraremos em nosso País natal, cheios de uma nobre e gloriosa vaidade. Estes são os nossos desejos; mas si os vossos fascinados irmãos do Maranhão, ou mesmo do Piauí, persistirem teimosos em fazer a facção política ou desmembração do Império Brasiliense, rebeldes aos decretos do nosso Augusto e Amado Imperador, acaso devemos nós consenti-lo? Não, mil vezes, não. primeiro derramaremos a última gota de nosso sangue. 

"Ah! Queridos e enganosos irmãos, que é o que temeis? E que é o que esperais? Temeis as forças do miserável Portugal esgotadas com as contínuas levas de soldados do sul do Brasil, onde todos têm sido sacrificados à deusa da Liberdade Brasiliense? Que esmaga suas cabeças com a mão armada do ferro com que pretendiam subjugar-nos?

"Este magnânimo liberal exemplo nos têm dado aqueles nossos intrépidos irmãos e por que não os imitais? Dezesseis províncias, desde além Prata até os limites ocidentais do Ceará, todas à uma voz, proclamam a liberdade e prestam gostosa obediência a D. Pedro. 

"Não temeis essas forças, muito superiores às vossas, e, existentes no vosso próprio continente e confiantes e temeis as de Portugal tão remotas e apoucadas? Que estranha mania! 

"Passando em silêncio os poderosos socorros que nos prestam várias nações do continente Europeu e Americano, vamos analisar o que é que esperais: 

"Oferece-vos, por ventura, grandes vantagens a dependência servil de Portugal, isto em tudo e por tudo; e não encontrareis nenhuma no comércio franco e liberal das Nações que a nossa Independência nos assegura? Tomo a dizer: que estranha mania!! Irmãos! Com que os ousais procedimento alheio a honra Brasiliense e até ao siso comum? Acaso vos decidis sobre a vossa futura felicidade pelo que ledes nas lodosas páginas do "Conciliador"? 

"Ignoramos que o seu redator é europeu e por isto nos oculta o conhecimento dos fatos que fazem o nosso bem e fazem o direito inalienável e decidida razão com que proclamamos a nossa independência? Ele nos chama faciosos, perjuros, incendiários; ele nos reputa estúpidos e iludidos agentes do velho despotismo; ele finalmente, afirma que o partido europeu é atualmente quase geral no reino Brasílico. Que mentira e que blasfêmia política! Proclamamos a Constituição a par da Independência; elegemos deputados paras as Cortes Brasílicas e estas se estão reunindo. O nosso imperador aclamou-se Constitucional e continuamos a conservar e a eleger governos provisórios: todas as questões sociais se decidem pela maioria de votos & &. Seria isto que o padre Tosinho chama despotismo? Se assim é, que, pois chamará constituição? 

"Quanto aos exemplos de consciência que estes senhores e outros iguais nos metem, não é mais que um pretexto próprio só para se enganar gentes rudes que ignoram a natureza dos contratos e o que eles obrigam. Os contratos são absolutos ou condicionais e estas condições ou são expressas ou ocultas, inarticuladas e para conhecermos que estas tem lugar é preciso examinarmos os direitos inalienáveis do homem, &. Este exame nos levaria muito longe e até acho escusado. Basta lembrar o acontecido no Porto e Daí deduzir, que, se os direitos podem ser violados sem se violar o juramento prestado, por que, agora, nas mesmas circunstâncias, o não podemos fazer? 

"Acaso será privilégio exclusivo dos europeus nos será preciso decorrer certo número de anos para adquirirmos esse direito? Tosinho que vos responda. Mas, no entretanto, nós que sabemos que os povos nunca se despojam desse direito essencial, abjuramos esses escrúpulos tosinicos. Que vos falta, pois, amados irmãos? Que vos impede os passos? Que vos prende a língua? Ai! Gritai comigo: 
"Viva a nossa santa religião! 

"Viva a futura Constituição Brasiliense! 

"Viva a D. Pedro I, Imperador Constitucional do Brasil e seu Perpétuo Defensor! 

"Viva a nossa santa Independência 

"Vivam todos os Brasileiros honrados, briosos e intrépidos! Quartel de Piracuruca, 22 de JANEIRO de 1823. 

Leonardo de Carvalho Castello Branco, alferes secretário da Divisão auxiliadora do Piauí.

Aderiu, pois, Piracuruca, a independência, a 22 de janeiro, antes do pronunciamento a capital. 

Vemos mais uma vez confirmado o fato histórico. Piracuruca aderiu à independência a 22 de janeiro, antes do pronunciamento de Oeiras, capital da Província. Sabendo dos acontecimentos, Major Fidié resolve retornar a Piracuruca para conter os rebeldes. No entanto, sua passagem, desta vez, não foi tão tranquila quanto esperava. 

No dia 24 de Janeiro de 1823, Oeiras, capital da província, e até então fiel a Portugal, aderiu à causa da Independência. 

Tomando conhecimento desse fato e de tumultos em Campo Maior, o Major Fidié, ainda em território piracuruquense, resolveu seguir em socorro daqueles que se mantinham fiéis à coroa portuguesa. No dia 10 de março, quando ainda não havia deixado o território piracuruquense, foi atacado por uma tropa de independentes na localidade Ilhós de Baixo. O combate ocorreu nas proximidades da lagoa do Jacaré. 

A historiografia piauiense testemunha que um grupo de 80 soldados do Exército Português sob o comando do Major João José da Cunha Fidié, encontrou-se com uma pequena tropa de independentes, composta de 40 ou 50 homens. Na luta, feriram-se alguns combatentes, morreram alguns independentes, enquanto os portugueses sofreram apenas uma baixa, um prisioneiro foi executado logo após a peleja. 

A batalha do Jacaré foi uma mostra do que viria a ser a batalha do Jenipapo, em Campo Maior, ocorrida em 13 de março do mesmo ano. 

Em Piracuruca, soube o chefe militar da disposição de luta dos piauienses em defesa do ideal da independência do Brasil. 

A memória desse acontecimento deve ser divulgada para que gerações futuras saibam que em Piracuruca, nas margens da Lagoa do Jacaré, foi onde primeiro se derramou sangue, no momento histórico em que o Piauí aderiu aos ideais de independência do Brasil. 

Retirando o entusiasmo retórico, pode-se afirmar que o zelo sagrado da conjuração para o nascimento da Pátria brasileira ocorreu nas sertanias piracuruquenses pago com tributo de sangue. O antigo território de Piracuruca fez sua parte. 

O registro histórico de Pereira da Costa está publicado no volume II da Cronologia Histórica do Piauí. Outros autores, como Vieira da Silva, Anísio Britto e Jureni Machado, relatam este episódio que honra o passado histórico de Piracuruca. 

A aspiração dos moradores era a elevação do povoado à categoria de Vila e isto não tardou a acontecer.

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