Sem crédito.
Agora, remoia o passado. E permanecia imóvel, a matutar como aquela “coisa misteriosa e desconhecida” o tinha lançado nas mãos daqueles demônios, que o torturaram com extremada crueldade, quase o levando a morte.
Logo em seguida, uma voz rouquenha ordenava:
Nota do editor: Este conto de Pedro Celestino, autor de Sinais de seca (Teresina, 1964), foi publicado, pela primeira vez, postumamente, na página Geração Pós 69, ficando no ar de 8 a 21 de agosto de 2004. Trata-se de um dos poucos escritos literários sobre a onda de incêndio praticada em Teresina, no período de 1941 a 1946 – ditadura Vargas e interventoria federal no Piauí do médico Leônidas de Castro Melo, com o endiabrado coronel Evilásio Gonçalves Vilanova (chefe de polícia e comandante da polícia do Piauí, acusado de ser o verdadeiro incendiador da cidade). Outro conto sobre o assunto é de autoria do Victor Gonçalves Neto, sob o título Fogo, que será publicado, aqui, em outra oportunidade (Kenard Kruel).
Pedro Celestino
I
I
- Fogo!
O homem teve vontade de correr. Uma casa de taipa coberta de palha, em chamas. O vento soprava forte e as labaredas faziam corcovas no espaço. Em seguida, o homem correu e entrou na casa ao lado da que estava queimando. Ao olhar para trás, notou que três desconhecidos o perseguiam e gritavam.
- Esteje preso!
O homem não esboçou nenhuma resistência. Suplicou, quase chorando:
- Deixem-me ver minha velha e abençoar meu filhinho.
Os verdugos, endiabrados, subjugaram o homem e o meteram na carinhosa, que estava estacionada próximo. Ao entrar no veículo, viu esgares que lembravam a “coisa misteriosa e desconhecida”, prenuncio de um tenebroso martírio. Esses esgares, durante todo tempo em que esteve na prisão, foram vistos, repetidas vezes.
II
Agora, remoia o passado. E permanecia imóvel, a matutar como aquela “coisa misteriosa e desconhecida” o tinha lançado nas mãos daqueles demônios, que o torturaram com extremada crueldade, quase o levando a morte.
Naquela fatídica tarde, quando executava o retelhamento do sobradinho da Praça João Luiz Ferreira, tarefa para qual tinha sido contratado pelo Cel. Evilásio, teve que voltar à sua casa para se alimentar, pois já passava do meio-dia e sua companheira já tinha regressado da fonte.
Certa noite foi retirado da cela e conduzido na carinhosa, depois de rodar um bom tempo, para um lugar ermo, na zona sul da cidade.
Certa noite foi retirado da cela e conduzido na carinhosa, depois de rodar um bom tempo, para um lugar ermo, na zona sul da cidade.
A porta do veículo foi aberta com violência. Ao tentar descer, recebeu um pontapé no traseiro, que o fez cair. Foram-lhe desferidos muitos chutes, enquanto seus carrascos repetiam, em vozes alternadas, a mesma indagação que já tinha feito em outros interrogatórios.
-Diz miserável, quem te mandou incendiar as casas?
Logo em seguida, uma voz rouquenha ordenava:
- Dá no rim desse cabra!
Sentiu um golpe forte sobre o rim esquerdo e desfaleceu. Quando recobrou os sentidos, quis levantar-se, mas não conseguiu se mover. Faltavam-lhe as forças, braços e pernas não obedeciam á sua vontade. Pressentiu que ia ser morto. Acudiu-lhe uma idéia e com ela salvou-se. Gritou a plenos pulmões:
- Viva o Presidente do Brasil!
Os algozes o largaram. Entreolharam-se, confusos. O apanharam e o puseram na carinhosa. Então percebeu que a seu lado jazia outro infeliz, também desconjuntado.
Depois de alguns meses, foi posto em liberdade. Ao sair da cadeia, foi aconselhado a esquecer aqueles dias. Mas, vez por outra, ouvia o terrível grito:
- Esteje preso!
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Nota do editor: Este conto de Pedro Celestino, autor de Sinais de seca (Teresina, 1964), foi publicado, pela primeira vez, postumamente, na página Geração Pós 69, ficando no ar de 8 a 21 de agosto de 2004. Trata-se de um dos poucos escritos literários sobre a onda de incêndio praticada em Teresina, no período de 1941 a 1946 – ditadura Vargas e interventoria federal no Piauí do médico Leônidas de Castro Melo, com o endiabrado coronel Evilásio Gonçalves Vilanova (chefe de polícia e comandante da polícia do Piauí, acusado de ser o verdadeiro incendiador da cidade). Outro conto sobre o assunto é de autoria do Victor Gonçalves Neto, sob o título Fogo, que será publicado, aqui, em outra oportunidade (Kenard Kruel).
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