Praça Pedro II, cortada ao meio, hoje, como antes???
Manoel Lima de Meneses Junior
Quando pus os pés em Teresina fiquei deslumbrado, fascinado, encantado. Adotei Teresina como terra natal e há quarenta e dois anos nela resido e sou grato por tudo que ela me deu. Admiro esta cidade pelo seu povo ordeiro, inteligente, humilde, trabalhador e principalmente por ser hospitaleiro e acolhedor.
A cidade cresceu, mas continua com ar provinciano, não perdeu a meiguice de cidade do interior, mantendo sua autenticidade.
Poderia falar da Teresina atual, que é maravilhosa com seus shoppings (Teresina e Riverside, e logo mais teremos outros), suas Praças, seus condomínios luxuosos que ora se instalam, de seus novos prédios residenciais, de suas pontes, dos bairros que a toda hora surgem, do comércio que cresce, de seus novos filhos legítimos que nascem ou mesmo dos adotados assim como eu, de suas Avenidas, seus pontos turísticos e de tudo que nos orgulha de sermos teresinenses, ou sonhar com o futuro, que sei, será promissor.
É no passado, porém, que alicerçamos o presente e o futuro, por isso, é deste passado próximo que quero recordar, da Teresina moça, de 115 anos, todavia sem melancolia.
Falar aos mais novos, como era nossa cidade há quatro décadas, onde podíamos namorar na porta de casa ou dormir na varanda da sala sem sermos incomodados.
Quero lembrar de lugares, fatos e pessoas que marcaram nossa cidade nesta época.
Recordar do velho Pé de Pequi da Vermelha, ponto de parada obrigatório dos expressos e pau de araras que viajavam para as cidades do médio Parnaíba, da baixa do Chicão, no cruzamento das Ruas Joaquim Ribeiro e Rui Barbosa, da Praça Saraiva pavimentada com um paralelepípedo marrom com uma rótula central, com as agências de ônibus, várias lanchonetes, uma movimentação enorme de passageiros, da missa dos jovens aos domingos, na Igreja matriz e da feirinha que funcionava logo após esta missa.
Como esquecer o rio Parnaíba navegável com seus vapores cheios de passageiros “rio abaixo e rio arriba”, de suas vazantes, de seus peixes e suas coroas que só apareciam no mês de julho? Como não lembrar da Palha de Arroz? E da Paissandu com seus Cabarés, dentre eles o Imperial, o Imperatriz, o Fascinação, o Estrela... Pontos de encontro dos mais afoitos. E, de outros cabarés menos requintados? Ora, quem naquela época nunca ouviu uma boa estória sobre o morro do querosene, com seus prostíbulos frequentados pelos menos aquinhoados?
Quem não visitou a Praça da Bandeira com seu pequeno e improvisado Zoológico onde tinha macacos, cobras e muitas aves?
O antigo e verdadeiro Troca-troca, onde predominava somente o escambo?
O Mercado Velho lotado de gente, funcionando também no piso superior?
Como era bom andar na Praça Rio Branco sem a presença dos camelôs, vendo seu relógio e as fontes luminosas funcionando. Em seguida descer pelo calçadão da Rua Simplício Mendes, livre para olhar a vitrine da Charmen’s ou das Casas Juçara.
Como passar hoje na Praça Pedro II e não lembrar que ela era cortada pela Avenida Antonino Freire que passava na frente do Cine Rex?
E como ainda não lembrar dos bares Acadêmico e Carnaúba?
Lembro ainda do famoso Balão da Miguel Rosa, da Rua do Fio, hoje Arlindo Nogueira, da Avenida José dos Santos e Silva que era uma galeria a céu aberto conhecida como barrocão, que tinha um cheiro insuportável e ainda da Rua Clodoaldo Freitas apelidada de Rua da Palmeirinha.
Recordo também da Rádio Difusora, da Rádio Clube com seus shows de calouros, da Rádio Pioneira com seu slogan “A emissora que não para”, com programas em sua grade como Seu Gosto na Berlinda, apresentado pelo mítico Rock Moreira, “onde o roteiro era feito pelo próprio ouvinte”, e os famosos avisos do interior, transmitidos ás cinco horas da tarde, repassados mais ou menos assim, “Caladão avisa para José, na localidade Barreiro do Raimundo Delmiro, que seguirá amanhã pela Empresa Morais no ônibus das seis horas. Pede para esperá-lo no Ribeirão Azul, levando os animais e frito. Solicita para quem ouvir o comunicado retransmitir ao destinatário.
E o tempo áureo da Escola Pública que evidenciou o Liceu piauiense, a Escola Técnica Federal do Piauí, a Escola Normal Antonino Freire, o Colégio São Francisco de Assis e ainda os mais periféricos como o Álvaro Ferreira, o Ginásio Popular com seu difícil exame de admissão e o Helvídio Nunes.
Como é doce lembrar-se daqueles rivengos transmitidos pelo Dídimo de Castro, dos comentários do Magro de Aço, do piauizão vibrante do Zé do Braga, do Auto-Esporte que, além dos craques, servia aos torcedores uma panelada na sede do clube e do Amarelão da Polícia Militar que enfrentou em pé de igualdade times do sul do país.
Quem naquela época não jantou na Churrascaria Beira-Rio, não dançou na Churrascaria Ponte, não comeu o churrasco do Gaúcho no Balão do São Cristóvão, quem não se lembra do Restaurante o Veleiro e ainda de ambientes pitorescos como a panelada do Lula na Piçarra, do Morais no Monte Castelo, da Maria Tijubina e do Manoelzinho no Mafuá, este sempre acompanhado do seu perfumado bode, da carne de sol do Coqueiro Verde e do pastel da Maria Divina?
Lembrar de Teresina no tempo de figuras como o carismático Dom Avelar Brandão Vilela e seu trabalho social, do Professor Castelo da ETFP, de Monsenhor Chaves com sua cultura, do Professor Cordão com sua franqueza, do Professor Domício e Melo Magalhães e sua escola, do Coronel Jofre com sua postura resoluta, do Padre Carvalho com seu espírito missionário, do Professor Paulino diretor do Ginásio O Popular, do Professor Chagas da Escola Normal, é um grande legado para os mais novos.
Viveram ainda neste período, figuras inusitadas como a Nicinha com seu estilo extravagante, com o corpo cheio de adereços; do vendedor de maguary com seu marketing “chegou o maguary”; do vendedor de alho que com várias “tranças”, saia vendendo sua mercadoria da Praça Saraiva até a Vermelha; do arrotador que com sua coceira crônica nos órgãos genitais afugentava as pessoas e do Chico Doido que andava sempre de mau-humor.
Existiram também comércios além dos já citados, que marcaram este tempo como a Diacuy Variedades, A Pérola, A Bela Aurora, as Casas Pernambucanas, a Farmácia Nossa Senhora de Fátima de seu Bem, que até consulta fazia, das Casas Moraes Sousa, da Vemosa, Casa da Lavoura, Créd-Sady e mais recente a Lobrás.
Alguns vendedores ambulantes vendiam produtos que faziam o deleite da população, como o cuscuz ideal que saia quentinho na hora com cobertura de coco, o flau bem geladinho, o pirulito vendido em uma tábua com furos e o algodão doce ou alfinim, que era feito na hora em cima de uma bicicleta.
Nas bodegas você podia saborear com bolachas que vinham a granel em latas, uma mirinda, uma crusch, um grapete ou ainda um delicioso guaraná tufy, que tinha um sabor único.
A Praça João Luiz Ferreira era conhecida pelo prédio do INPS e este pelas filas homéricas para se marcar uma consulta. Dependendo da especialidade do médico, o interessado chegava às seis da tarde, para ser atendido às sete da manhã do dia seguinte. Nesta hora, ele recebia uma credencial para ser atendido até com sessenta dias. Havia muita confusão e às vezes a polícia era chamada. Era um constrangimento enorme. Quando o caso era de urgência o paciente se deslocava até o SAMDU. Os pacientes com doenças não diagnosticadas eram transferidos para o isolamento que ficava ao lado do necrotério, em uma ambulância do tipo veraneio, se viesse a óbito era só chamar o funeral. Já os amigos do alheio eram conduzidos ao 1º DP em uma kombi, que tinha um barulho de sirene característico, apelidada de “Rita Pavone.”
Carnaval sempre será uma festa contagiante, só que o daquele tempo era bastante esperado, visto que só era uma vez no ano, então todos aproveitavam ao máximo. A alegria daqueles blocos de sujos, desfilando na Avenida Frei Serafim, dos corsos onde os veículos pintados a caráter circulavam pela cidade, aboletados de foliões que jogavam água e talco nos transeuntes. Ao entardecer todos se encontravam no bar do Gellati, local onde se fazia a “base” para noite ir aos clubes. É inesquecível. Passado o carnaval, o resto era assistir os filmes no Royal, no Rex ou no cine São Raimundo, vulgo “baganinha” e freqüentar as tertúlias, regadas a bate-bate e músicas dos Pholhas até altas horas... No entanto, se tinha certeza de voltar para casa sem correr risco de ser assaltado.
Lembrar da cidade verde, do tempo em que propaganda de sabão era assim: “Bom só... Bom só... Vem cá meu filho!”, em que o estádio Albertão era local de jogo de futebol e não de emplacar veículos, em que a Cepisa era uma Usina Termelétrica movida à lenha, quando o crime do carteiro Elzano, o da doméstica e a chacina do Posto King não eram banais.
Do tempo em que as pessoas ficavam em polvorosa com a estória da cobra sucuri que apareceu no bairro dos noivos ou ainda com a figura do satanás que os policiais e presos afirmaram que apareceu várias vezes no Distrito da “Boca de Pau”.
Era uma época bem mais difícil, a presença das pessoas era necessária em todas as situações, bem diferente da automatização atual. Entretanto existia mais honestidade e solidariedade.
Quem vivenciou estes fatos e transformações jamais esquecerá.
Sei que os dias atuais, são apressados, as pessoas não param mais para meditar, existe uma sede voraz pelo enriquecimento rápido e desregrado, onde todos querem ser importantes, embora sem merecer.
O ser perde espaço para o ter e o gosto pela simplicidade perdeu o valor.
O certo é que Teresina evoluiu, cresceu, progrediu e com isso, vieram alguns problemas que são normais em grandes cidades.
Esse tempo reportado foi bom, mas estamos no século XXI, não podemos esquecer que o tempo é hoje, os dias atuais são melhores que os de ontem, pois tudo é on line, mais bonito, mais dinâmico. Precisamos somente redirecionar o rumo da História, resgatar a dignidade do nosso povo, através da educação, ensinando-o coisas palpáveis que migrem para a sabedoria, uma Saúde descente e mais Segurança.
Sonho com uma Teresina metrópole, acelerando o progresso de todo o Piauí, com viadutos, novas pontes, novos shoppings, arranha-céus, indústrias, novos políticos, menos desemprego, melhor distribuição de renda, mais justiça social e tudo que uma cidade grande possa ter. Que seja ainda, incluída no contexto nacional, que não seja vista somente pela sua temperatura de trinta e oito graus na previsão do tempo, até mesmo cosmopolita, inserida também no cenário internacional, contanto que não perca seu brilho, seu verde, seu calor que é humano e sua generosidade.
Teresina! como é bom viver debaixo do teu verde e do teu calor.
3 comentários:
Voce falando assim de Teresina, abre a caixa de saudades que cada um que viveu nessa cidade carrega. tive esse privilégio dos 7 aos 18 anos e hoje desterrado apenas choro como que delira na beira do cais.
saudades do toca do coelho,a famosa 7 portas,onde os meninos aprendiam o caminho do pecado,o clube dos tenentes e sargentos na ilhota,a famosa galinha da julia,o bar flutuante,as escolas de samba ziriguidum e império do samba,piratinga do ritmo,do vereador toranga,e a minha escola sambão que competia acirradamente com a brasa samba.tempos que não voltam mais,mas a vida continua. ASS:Francisco pimentel
Fantástica lembranças que renova a bela Teresina do passado. Parabéns.
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