domingo, 1 de abril de 2012

Literatura Piauiense, existe ou não existe?

Jornalistas Kenard Kruel e José Fortes Filho.

O jornalista José Fortes Filho está dando últimas limadas no livro Literatura piauiense – existir ou não existir, eis a polêmica, em que registra artigos publicados nos jornais O Dia e Jornal da Manhã, entre os anos 1980 e 1981, pelas melhores inteligências da terra sobre a existência ou não da literatura piauiense. Tudo começou quando a Universidade Federal do Piauí e a Academia Piauiense de Letras promoveram, no período de 24 a 28 de novembro de 1980, no auditório da UFPI, o I seminário de Literatura Piauiense, com a participação de centenas de alunos, professores, escritores, dentre outros interessados no tema, como Camilo Filho (reitor da UFPI), A. Tito Filho (presidente da Academia Piauiense de Letras), H. Dobal, Álvaro Pacheco, Fontes Ibiapina, Cassy Távora, Carlos Daniel, Oswaldo Soares, J. Miguel de Matos, Bugyja Britto, Balduino Barbosa de Deus, Humberto Soares Guimarães, Lindeberg Pirajá, José Ribeiro e Silva, Pompílio Santos, Cineas Santos, Kenard Kruel, Francisco Miguel de Moura, Herculano Moraes e o próprio José Fortes Filho. 

No I Seminário de Literatura Piauiense diversos temas foram abordados (estruturalismo, por exemplo), algumas obras foram analisadas (Beira Rio, Beira Vida, de Assis Brasil), com depoimentos dados por H. Dobal, Fontes Ibiapina, Cineas Santos, Álvaro Pacheco, dentre outros. 

O I Seminário de Literatura Piauiense teria passado em brancas nuvens se não fosse a empolgação exagerada do José Fortes Filho que, em artigo intitulado Movimento Literário de 80, publicado em 30 de novembro de 1980, no jornal O dia, o comparou à Semana de Arte Moderna, realizada nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo, em que tomaram parte Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Graça Aranha, Villa-Lobos, Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Manuel Bandeira, Menotti Del Picchia, Ronald de Carvalho, Vicente do Rego Monteiro, Victor Brecheret, Guilherme de Almeida, Plínio Salgado, Sérgio Milliet, Tácito de Almeida, Wilhelm Haarberg, Zina Aita, John Graz e outras figuras mais ou menos carimbadas. 

O contista M. de Moura Filho que, adianto logo, não é filho do crítico e acadêmico Francisco Miguel de Moura, publicou na edição de 14 de dezembro de 1980, no Jornal da Manhã, Desmitificar é preciso, afirmando: “O I Seminário de Literatura Piauiense foi estruturalismo – embora na França, Lévis-Strauss, em 1968, tenha anunciado a morte desse troço – foi, antes de tudo, reacionarismo”, acrescentando: “ O que se pode esperar de um Seminário onde a Academia Piauiense de Letras se faz presente como uma das promotoras, juntamente com conspícuos professores retrógrados? ... Mister se diga que esses professores ainda hoje rendem culto ao Parnaso, destroçado pelo Movimento de 1922, e como poeta modernista reconhecem apenas Carlos Drummond de Andrade.” 

No dia 21 de dezembro de 1980, José Fortes Filho publicou no Jornal da Manhã o seu A bem da Verdade, discordando “da maneira pouco enaltecedora e agressiva como se comportou o contista M. de Moura Filho”, ao tempo em que afirmava: “temos que valorizar o que é nosso, uma vez que o I Seminário de Literatura Piauiense foi um evento importante para os intelectuais da terra.” 

E vieram artigos e mais artigos, ataques e mais ataques não só às ideias, mas, também e principalmente, aos donos das ideias. O contista M. de Moura Filho foi tão atacado, que O. G. Rêgo de Carvalho, o nosso mais expressivo romancista / contista / novelista, saiu de sua toca e veio em sua defesa, dizendo: “O jovem escritor está cheio de razão, e não estaria se saísse a louvar o que não existe: literatura piauiense. Literatura, é bom repetir, é um conjunto de obras de arte, em prosa e verso. E eu não conheço, de autores piauienses, três livros que se possa enquadrar nesse conceito”. (...) “Assim, não há o que reprovar na atitude de M. de Moura Filho, cuja coragem eu admiro.” 

Da polêmica participaram Cassy Távora, Kenard Kruel, Domingos Bezerra, Airton Sampaio, Pompílio Santos (Ivan), Luiz Pires, J. Miguel de Matos, José Lopes dos Santos e até mesmo o poeta maranhense Fonseca e Silva, que ainda hoje pensam que sou eu. O coitado, soube, morreu à míngua (destino de quase todos os literatos que não sejam Paulos Coelhos da vida) devorando os tijolos e a madeira de sua casinha ao lado do Museu do Presidente José Sarney, em São Luís (MA). Oremos por ele... 

A partir de hoje, passarei a publicar aqui, na kenard kaverna, os artigos originados do embate sobre a importância ou não do I Seminário de Literatura Piauiense, objetivando apenas o simples refrescar de nossas memórias, quando o alemão já começar a rondar nossas mentes. Que assim seja, Amém!

4 comentários:

Washington Ramos disse...

Kenard, sobre essa polêmica é interessante ler O Tronco, romance de Bernardo Éllis. A partir desse livro, é possível fazer algumas observações pertinentes sobre a existência ou não da literatura piauiense.

Kenard Kruel disse...

resume de o tronco, romance de bernardo élis (ou éllis):

Nome de maior projeção no grupo dos modernistas de Goiás, Bernardo Élis começou a sua carreira pela poesia. Tornou-se referência do regionalismo tradicional com os contos de Ermos e Gerais (1944) e, sobretudo, com seu primeiro romance, O Tronco (1956). Este segundo livro enfoca a disputa pelo poder numa vila do extremo norte de Goiás, o Duro, último reduto da família Melo. Conhecidos pelo despotismo com que governam a região que fundaram, os Melos são combatidos por toda parte. O idealista Vicente Lemes, parente dos Melos e nomeado coletor por influência deles, luta para restabelecer a paz. Mas a intervenção da Força Estadual precipita uma luta bárbara que, sem assegurar o cumprimento das leis, prejudicará ambas as partes. O romance é extraído de uma história real, de fatos ocorridos em Goiás, nos idos de 1917 e 1918.

No sertanismo goiano-mineiro, que passou a competir em prestígio com a literatura do Nordeste, Élis, por causa de Ermos e Gerais, antecipou-se a Guimarães Rosa (Sagarana é de 1946), Mário Palmério (Vila dos Confins, 1956) e José J. Veiga (Os Cavalinhos de Platiplanto, 1959). Nascido em 1915, em Corumbá de Goiás, Bernardo Élis Fleury de Campos Curado iniciou-se na carreira pública como secretário da Prefeitura Municipal de Goiânia. Depois, fez carreira no magistério. Foi fundador da União Brasileira de Escritores de Goiás e membro da Academia Brasiliense de Letras, para a qual foi eleito em 1975. Morreu em 1997, na sua cidade natal.

Washington Ramos disse...

Ler o romance mesmo, Kenard! Em resumo, não dá pra se perceber a relação que ele tem com o que chamam de literatura piauiense. Eu já o li e o recomendo a você.

Kenard Kruel disse...

wr.: por júpiter, estou lendo o recomendado, preciso apenas que você tenha calma. enquanto isso, fique tirando ouro do nariz, com perdão de cda.