sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Torquato Neto vira brega com Celso Junior

Tropicália alegoria é isso, aí, bicho...


A composição “Pra dizer adeus”, do piauiense Torquato Neto em parceria com Edu Lobo, interpretada em tempos idos por Elis Regina e Maria Bethânia, duas vozes ícones da MPB, virou brega no Maranhão com o desconhecido Celso Júnior. A proposta foi levada pelo defensor público e escritor Ricardo Luís de Almeida Teixeira, que reside em São Luís.

Para ele, a “obra de arte” de Torquato Neto merecia uma versão “mais dramática”. Quis fazê-la tango e não conseguiu. Encontrou abrigo no brega. Ricardo Luís tem participação especial na “Grande Enciclopédia Internacional de Piauiês”, do jornalista Paulo José Cunha. Ele é o autor da “Gramática do Piauiês”, que encerra o livro. A idéia desagradou, e muito, o parceiro, que conviveu com Torquato Neto.

Ricado Luís reconhece que a reação de admiradores de Torquato Neto poderá não ser de aplausos. Ao contrário, espera algum repúdio pela ousadia. Leve-se em consideração que Celso Júnior não é nenhum talento musical e antes de cantar “Pra dizer adeus” nunca ouvira falar em Torquato Neto.

“Não espero uma boa reação dos admiradores de Torquato. Creio que não sejam tolerantes com a grandeza da música brega. Mas, espero uma boa reação dos amantes da música brega e, assim, milhares terão a curiosidade”, afima Ricardo Luís. Paulo José Cunha ouviu a versão e retrucou: “Uma bosta. Não vale nem como piada”.

Torquato Neto suicidou-se no Rio de Janeiro um dia após completar 28 anos, no dia 10 de novembro de 1972. Pouco tempo de vida, mas muita história para contar.

Fosse vivo, talvez até aceitasse a bregarização de uma composição sua, assim permite interpretar uma de suas frases registradas: “Escute, meu chapa: um poeta não se faz com versos. É o risco, é estar sempre a perigo sem medo, é inventar o perigo e estar sempre recriando dificuldades pelo menos maiores, é destruir a linguagem e explodir com ela. Quem não se arrisca, não pode berrar."

O Acessepiaui tomou declarações do próprio Ricardo Luís, de Paulo José Cunha, que reside em Brasília, e do Presidente da Fundação Cultural Monselhor Chaves, Cineas Santos. Estão disponíveis aos leitores a letra e as versões de “Pra dizer Adeus” de Elis Regina (com Zimbo Trio), Maria Betânia e Celso Júnior

Ricardo Luís

“Sempre gostei da música Pra dizer adeus. Ela é dramática e, ao mesmo tempo, romântica. Ela é profunda e, ao mesmo tempo, singela. É uma verdadeira obra de arte. Todavia, eu tinha vontade de ouvir a música em uma versão dramática. Pensei em fazer dela um tango, pois não há nada mais dramático do que um tango. É por isso que Belchior diz ‘um tango argentino me cai bem melhor que o blues’. Todavia, como não sou músico, sou apenas um escritor, não consegui fazer um tango. A partir disso veio a ideia de fazer uma versão brega, pois o brega tem um lado dramático muito forte. Dessa forma , pedi para o amigo Celso Júnior fazer uma versão brega da música, o que foi feito com maestria. A música Pra dizer adeus não é brega, mas tem um lado dramático que combina com uma versão brega. Celso Júnior (52 anos) não conhecia a obra de Torquato Neto, pois sempre foi um artista brega. Ou seja, sempre ocupou o ‘outro lado da rua’”.

Paulo José Cunha 

“Já ouvi. Uma bosta. Simples: é ruim até como piada. Espero por outro brega, mais engraçado, menos down. Quando o Didi fez uma paródia de ‘Louvação’ (letra e música de Torquato Neto), brincando ‘Vou fazer a lavação’ enquanto lavava uma trouxa de roupas, adorei. Mas essa aí é de nos matar de vergonha. Nem para rir serve.”

Cineas Santos

“A obra só pertence ao autor antes de ‘nascer’; uma vez nascida, pertence ao mundo. ‘Cio da Terra’, por exemplo, já foi gravada por braganejos. Nada de extraordinário: se você não gosta, basta não ouvir. Há versões – e deve ser assim – para todos os gostos. Torquato Neto não é sagrado; é um autor e, como tal, deve ser tratado.”

Pra dizer adeus

Torquato Neto / Edu Lobo

Adeus
Vou pra não voltar
E onde quer que eu vá
Sei que vou sozinho
Tão sozinho amor
Nem é bom pensar
Que eu não volto mais
Desse meu caminho
Ah, pena eu não saber
Como te contar
Que o amor foi tanto
E no entanto eu queria dizer
Vem
Eu só sei dizer
Vem
Nem que seja só
Pra dizer adeus

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