quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Política em mesa de bar

Escultura de Conversa de Botequim
de Noel Rosa, em Vila Isabel, Rio.


Imagine só, caro leitor. Em todos os bares, aos sábados e domingos armam-se tribunas, os fregueses, tentam salvar a pátria através do diálogo. Alguns se exaltam. Ali as noticias dos jornais são discutidas. Começa-se saber de que lado cada um se encontra. Um espinafra o presidente que não está nem ai, pois vive sempre viajando. Voando. E tem uma claque muito boa que não para de bater palma para ele.

Outros espinafram o velho Sarney, um dos últimos coronéis dos sertões do nordeste, que fez sua estrada desde os tempos da UDN, percorrendo atalhos e desvios foi deputado, chegou a governador, escolhido pelos militares, no tempo da ditadura. E por um golpe do destino chegou à presidência do Brasil, depois da morte de Tancredo. Treva. Quando terminou seu mandato desastroso virou senador pelo estado do Amapá. Há quem defenda o Sarney, Ele não é um homem normal, com a biografia que tem. Mas é preciso que seja bem lida, nas entrelinhas, para que se possa compreender melhor o seu conteúdo. Pena que o povo brasileiro não sabe ler. E a imprensa que tem a mania de transformar os fatos em metáforas complica ainda mais o entendimento da plebe, e todo vira ficção. Realismo mágico. Castelos mal assombrados, com passagens secretas...

Mas vamos deixar o Sarney em paz, que é o que ele quer. Alguém já quase bêbado, mas, ainda, se agüentando nas pernas, pede a palavra, diz que a corrupção é como cachaça, a gente toma, bebe o primeiro copo, depois o segundo, acha bom, e não pára mais. Diz que a corrupção começou desde os tempos de colônia, império e consagrou-se na república quando começou a correr mais dinheiro. Hoje é um mar de lama, onde quase todos os políticos estão afundando. E que não adianta reforma, pregar remendo novo em pano velho. Está na Bíblia. E os políticos não ligam para religião. Se aparecer outro Dante para escrever outra divina comedia eles estão todos no inferno. Têm o rabo preso e vão arder no inferno junto com as suas pizzas. Seria melhor retirarem a palavra Deus da preâmbulo da Constituição, isto é uma farsa, pior do que Pilatos lavando as mãos. O bêbado cala a boca. Outro continua. O Brasil não é um país sério Mas não vamos misturar o estado com a nação. Nosso povo é trabalhador e honesto. Acorda cedo, pega ônibus, se esfalfa no trabalho, ganha pouco, mas vai resistindo. Não troco um anônimo cidadão que trabalha por nenhum deste políticos que só falam besteira e não respeitam os seus eleitores. Não ligam para a opinião pública...

Mas política sempre foi assim mesmo, diz alguém que parece não estar tão bêbado. Todo povo tem o governo que merece.

E você merece o que?

Eu mereço um ato secreto, uma nomeação para o Senado.

Bom. Se você fosse afilhado do homem, quem sabe?

É. Boca falou cú pagou. Muitas vezes o cara só fala da boca para fora. Mas se tivesse lá em cima gozando de consideração, fazendo parte da igreja, não vacilaria um minuto em aceitar uma vantagem condecorada e remunerada. E isso aí cara, você, por exemplo, se daria bem. Não vejo por que não. Sou daqueles que dançam conforme a musica. Neste país nunca vi nenhum político ir para a cadeia. São eles que fazem as leis e desfazem. O estado é uma máfia legalizada, e protege os seus membros. Bem pensa e tem juízo quem fica de seu lado. Porra cara pede mais um copo pra ver se tu melhoras.

In vino veritas.

O dono do bar olha para o relógio. É mais de meia noite. Ele não está gostando muito da conversa besta de seus fregueses. Mas como também tem de fazer a sua política, não diz nada. Evita expressar a sua opinião Quer agradar a gregos e troianos... Mesmo assim diz que daqui meia hora vai fechar o bar. E sente muito ter que acabar com a assembléia de seus fregueses. Gostou do papo. Quem sabe da próxima vez, no sábado, dará a sua opinião.

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