Foto de Paulo Aquino.
Durvalino Couto
Quero dizer ao meu amigo Joca Oeiras que, certa vez, saindo do Mercadão de São Paulo, onde estava ocorrendo o primeiro Encontro Piauí-Sampa – saímos juntos, eu e ele, pelas ruas do centro da fabulosa metrópole, a pé, caminhando por aquele centro sombrio e belo, onde parecia que as paredes gritavam para nós, eu e ele, assim. Nosso destino era atravessar a cidade, pois íamos nos encontrar com amigos num outro extremo, na Feira da Pompéia. Foi um dos maiores prazeres que tive vivendo ali, aquele momento em Sampa. Estava eu ali, andando com o Joca, e vez ou outra ele fazia um comentário sobre determinadas ruas, esquinas, prédios, edificações, sobre o passado que aquelas paredes nos diziam. A mim, um estranho, e ao Joca, um paulista, era tudo uma coisa só. Éramos os mesmos sob a égide do passado.
De repente vejo o Joca debruçado sobre um outro passado, dessa vez muito mais meu que dele. E me sinto absolutamente à vontade para autorizá-lo a viver esse direito: o de fazer reviver importâncias, mesmo que as tenhamos perdido, mesmo que ele, pessoalmente, não tenha convivido, mesmo que não tenhamos existido, como se fôssemos filhos de uma mesma história e as paredes apenas gritassem para nós, fantasmas nós e não as paredes.
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Digo isso porque Joca se incumbiu agora de fazer esse livro, o de resgate de um bar que existiu em Teresina, e que ganhou esse nome maluco de "Nós e Elis". Foi, sem dúvida, um momento muito importante na cidade. O Nós e Elis fecundou nossas esperanças, nos uniu enquanto artistas e músicos e fez valer o talento de cada um – sem falar do tanto de amor que gerou, do tanto de pessoas que ali se conheceram e dos desdobramentos dessa vida. Posso até dizer que foi ali no Nós e Elis que minha filha Faena foi concebida, pois foi ali onde conheci a mãe dela, e hoje tenho por ambas um sentimento de gratidão e alegria que extrapola qualquer comentário superficial ou tolo a respeito. A memória é minha e acabou-se. Ou não.
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O Nós e Elis é testemunha de muitas vivências. E a feitura desse livro tem uma importância singular. A de encantar pessoas que jamais saberão que diabo de bar foi esse que virou legenda, polêmica, intriga – e no entanto era apenas um bar onde íamos tocar, cantar e procurar ser felizes. Atribuo ao Joca essa importância e essa missão. Sempre gostei muito de bar, e o Nós e Elis foi importantíssimo para os artistas de Teresina. Tenho pena dos ressentidos que combatem esse projeto. Não adianta, lamento decepcioná-los. A figura do Elias, sua esposa, os amigos, os garçons, as noitadas, aquele tempo em que eu gostava de tomar Campari com água tônica agitada no copo, espirrando espuma pra todos os lados, fazendo os amigos pularem pra longe, as noites em que terminava perdido nos braços de uma morena inesquecível, ou porque toquei muita bateria e depois só queria papear com os parceiros. Tudo isso é muito importante para mim. O Joca, que seja o curador desse momento/sonho. Dizem que os sonhos sempre voltam. Elis continua cantando nos nossos sons. Aliás, quanto a isso, afirmo que Elis Regina está cantando cada vez melhor. E o Nós e Elis, por que não?, continua vibrando nas nossa retinas cansadas. Uma pena se você não entende, não vê, mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo – uma nova mudança em breve vai acontecer: o livro do Nós e Elis vai sair. Pois ainda somos os mesmos.
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