quinta-feira, 23 de julho de 2009

A literatura na escola

Cineas Santos. Foto de Kenard Kruel.

Cienas Santos.

Independentemente da obrigatoriedade determinada por lei, a literatura deve ser ensinada nas escolas desde as séries iniciais. Para tanto, deve prevalecer a capacidade motivadora do professor e o seu poder de persuasão. A escola deveria incluir a literatura no rol das atividades lúdicas e não como disciplina obrigatória. Os textos, escolhidos com critério, deveriam ser prazerosos, estimulante. Isso, evidentemente, demandaria a presença do professor-leitor, avis rara entre nós.

Uma das maiores frustações que experimentei como editor deu-se justamente numa aposta que fiz na figura desse professor que imaginei existir nas escolas do Piauí. Há seis anos, editei uma bela coleção denominada Contar, com textos dos maiores escritores piauienses. Figuravam nela de O. G. Rêgo de Carvalho a H. Dobal, passando por Fontes Ibiapina, Graça Vilhena, Airton Sampaio, Magalhães da Costa etc. Eram contos curtos, criteriosamente selecionados, ótimos para serem usados em sala de aula. Os livrinhos, com um máximo de 40 páginas, eram vendidos a preço de picolé: dois reais o exemplar. Fracasso total: o único título que esgoutou-se rapidamente foi Fogo, de Victor Gonçalves Neto, por figurar na relação do vestibular de uma das universidades piauienses. A Coleção Contar encalhou, fato que me deixou profundamente abatido. Certa feita, conversando com um professor de uma das escolas "de ponta" de Teresina, o cidadão me clareou as idéias. Disse ele: "A coleção é excelente; para ser completa só falta o manuel do professor". Bingo! Faltava o maldito manual com as perguntas e respostas prontas. Sem ele, o professor já não trabalha. Ler o livro, interpretá-lo, elaborar exercícios, tudo isso demanda tempo e sacrifício para quem "ganha tão pouco".

O certo é que, entre nós, o ensino da literatura, com honrosas exceções, se limita aos manuais editados pelas grandes editoras e aos malditos "resumos de obras" elaborados por espertos. Não precisa ler a obra: leia o "resumo" contendo detalhes dela e tudo se resolverá. Isso é a negação de tudo que se pareça com educação.

Cabe a nós professores começar essa triste realidade, tarefa que precisará, evidentemente, da participação dos diretores das escolas e das famílias dos alunos. Que a literatura esteja na escolha hoje e sempre sem a necessidade de leis, feitas apenas para serem cumpridas.

O Dia, Metrópole, domingo, 31 de agosto de 2008.

Um comentário:

Airton Sampaio disse...

Acho que o problema, hoje, não está em apenas convocar os professores à leitura e à adoção de livros de autores piauienses nas escolas, ainda que de qualidade e a preços muito baixos, como foram realmente os da Coleção Contar. Mas só vou me convencer de todo que um livro nosso não vende mesmo quando houver sobre ele uma campanha profissional, ampla e pesada de divulgação (inserções diárias e muitas em tvs e rádios, outdours distribuídos pela cidade inteira, meias-páginas diárias de jornais no mínimo, baners constantes na internet, etc, e, principalmente, o livro disponível ao comprador nas vitrines da livrarias, e não escondidos no fundo do fundo do fundo dela). É assim que os Harry Potter da vida vendem pelo ladrão. E é só assim, apenas após uma campanhona dessas, que eu vou poder dizer: os autores piauienses não vendem mesmo. Mas isso requer grana, muita grana. Antes disso, qualquer decepção é justa (eu que o diga), mas ainda carente de bases de análise mais completas. Infelizmente, o que se ouve falar, agora menos amiúde porém até com defesa desse absurdo de público pelo secretário de comunicação Wellington Soares, é em se torrar um milhão de reais em dinheiro público com um filmeco do Frank Aguiar. Assim... não dá!